Na sexta, é Cinderela querendo ir ao baile encontrar seu príncipe encantado. Sábado, é a filha do Rei que precisa de encantos para ser bela, cantora e ser acordada pelo beijo de um nobre apaixonado, como se nascer rica já não fosse o bastante. Domingo, tem garoto de pau que quer virar homem, mas sem deixar de ser cara de pau. E assim vai. Não se passa um dia sem alguém pedir à pobre fada alguma benção. Oras, e ela como fica? 50 anos, solteirona, cheia de contas para pagar, tendo de voar de um reino para o outro com duas asas velhas e gastas. Não há quem agüente. E vá perguntar se um dos seus afilhados, depois de conquistar o seu feliz para sempre, se lembra dela. Nada. Nem vê a cor do dinheiro e olha que anda precisada. A varinha de condão está carente de reparos. Só pega um encanto na segunda tentativa. Já teve caso de sapo, em vez de belo príncipe, virar cobrador de imposto de renda quando beijado. A princesa vítima do engano, não declarando seu castelo nem os sete anões, foi processada e teve seus bens confiscados.
Exausta, estressada, a fada madrinha resolveu então que era hora e vez de cuidar de si mesma, pois não havia quem fosse lhe abençoar. Depois de muitas estrelas e fagulhas saindo da varinha e das palavras mágicas certas, fez uma plástica, turbinou os seios, colocou botox, arranjou um namorado com pinta de integrante de boy band e virou cantora de jazz. Sua história não foi parar na capa dos livros de fábulas nem seu final foi feliz para sempre. Nos salões reais, as princesas e os príncipes, que tanto desfrutaram de sua ajuda, agora cochichavam o absurdo de uma fada ter tal atitude. “É uma perua”, diziam. “Que vergonha!”, sussurravam. “Tem idade para ser a mãe dele!”, condenavam, “Onde foram parar os valores antigos?”
Desmoralizada, a fada que voou alto demais nunca mais foi requisitada, mas pelo menos teve o seu próprio fim.
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Mundos paralelos
A tela da TV é tão colorida, o celular me deixa tão mais perto de todos, a internet, nem se fala! No livro que eu leio, os personagens são incríveis, mesmo os mais tolos, que vivem apenas algumas linhas, tem suas profundidades e suas metáforas. Mas fora dos livros, dos celulares, dos lcds de preços variados, é tudo mais cinza, mais vazio, sem palavras, sem sentido, sem caminho, desconectado. Fora deles, estou sozinho.
domingo, 26 de setembro de 2010
Instantes não recicláveis
No dia que Ricardo conheceu o amor da sua vida, ele lhe passou um pacote de fandangos e uma cerveja long neck. Ela identificou os preços e colocou os produtos numa sacola. Nenhum olhar foi trocado, apenas dinheiro. Ele disse obrigado e ela, obrigado você. Depois nunca mais se viram.
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Causa perdida
Duas pistolas. Dois homens. Dois pares de pés tomando distância um do outro. Uma donzela aflita. Ela morde o lábio e prende a respiração com medo de que a mais leve alteração no ar pudesse acionar os gatilhos. A preparação do duelo termina, os homens estão prontos para apontar armas. Gotas de suor escorrem do rosto da donzela, ela fecha os olhos. Os dois se viram, frente a frente, e posicionam a mira. Quem vencer, leva o prêmio: a mão da donzela em casamento.
Ela grita: Eu sou lésbica!!
O som passa pelo ouvido, vai até o cérebro, é concebido, mas não chega rápido o bastante aos dedos, que puxam o gatilho.
Dois corpos caem no chão.
Ela grita: Eu sou lésbica!!
O som passa pelo ouvido, vai até o cérebro, é concebido, mas não chega rápido o bastante aos dedos, que puxam o gatilho.
Dois corpos caem no chão.
domingo, 12 de setembro de 2010
Dicionário marginal
Palavrão é vocábulo do desabafo. Quando é preciso se expressar, um palavriado xulo é melhor do que qualquer metáfora ou requinte. Não se tem requinte no desespero, no fio da navalha. Quando a gente ta em perigo: Merda! Quando um cara te fecha na rua: filho da puta! Quando a gente admira alguém mais da conta: é foda pra caralho! Como proibir isso?
Difícil me lembrar do meu primeiro palavrão. Na infância, às vezes a palavra “droga” pode ser considerada um tabu por mães. “Que droga, mãe, não quero ir à aula!” “E a mãe dá um tapa disciplinador no garoto. “Não fale comigo desse jeito! Já não me basta o seu irmão que começou falando cacete e terminou ouvindo rock!!”, E aí ela cospe no chão e faz sinal da cruz.
Bem, só para constar, a minha velha não chegava a tal ponto. Tampouco podia eu vagar pelas margens do dicionário. Tinha que me contentar com caracas, putz grila, caramba, droga, bobão e, nos piores casos, imbecil. Se chegava algo mais irreverente e ofensivo aos meus ouvidos pelas vozes de tios e companheiros libertinos, eu simplesmente não entendia o que podia significar. Só fui entender o que seria viadinho depois da terceira série e depois de ter concordado com um colega que apontou o fato de eu ser viadinho.
Foi no ônibus escolar. Eu estava especialmente bem humorado no dia e me divertia fazendo voz fina, o que não necessitava de muito esforço já que minha voz nunca foi lá muito grave. Achava engraçado a besteira. Depois comecei a chamar pelo nome de alguns colegas com essa voz. Um dos mais altos da série não gostou muito e declarou:
-Maior viadinho!
Eu não via problema nisso. E, como parecia irritar o garoto, subi alguns tons na escala musical para repetir “viadinho viadinho”. Não foi algo que contribuiu muito na minha vida escolar, certamente, mas viria a ser apagado por outras situações mais embaraçosas no decorrer da minha existência.
De qualquer forma, podem ver que eu não era descolado, muito menos esperto. O meu português não era culto o bastante, mas nada que me fizesse parecer o gangster ou qualquer coisa assim. Na verdade, eu mal falava. Às vezes tinha um surto de bobagem, como no caso do ônibus, só que era raro. Para o meu espanto, porém, um colega disse que eu era desbocado e voltei para casa com isso na cabeça.
Tentei refrear nas palavras, mas logo descobri os seus sentidos e aí é impossível evitar dizê-las, pois você percebe a possibilidade de exprimir toda uma gama de sentimentos nunca antes explorados. Pela primeira vez eu tinha algo a dizer dos professores, dos colegas idiotas e dos desenhos que eu gostava. Claro isso deu uma outra perspectiva aos “viadinhos” que volta e meia eu ouvia sendo referidos a minha pessoa. Daí eu podia dizer foda-se e sair por cima, caso alguém não mandasse um corroda-se, me deixando sem ação nenhuma.
Hoje, sou versado nos palavrões e não perco a chance de dizer um porra, na frente de quem puder. A grande merda é que a vida adulta traz toda uma nova série de sentimentos e problemas que não encontram equivalentes no meu Aurélio Marginal. Para esses novos tempos, se faz necessários palavrões à altura, muito mais pesados.
Difícil me lembrar do meu primeiro palavrão. Na infância, às vezes a palavra “droga” pode ser considerada um tabu por mães. “Que droga, mãe, não quero ir à aula!” “E a mãe dá um tapa disciplinador no garoto. “Não fale comigo desse jeito! Já não me basta o seu irmão que começou falando cacete e terminou ouvindo rock!!”, E aí ela cospe no chão e faz sinal da cruz.
Bem, só para constar, a minha velha não chegava a tal ponto. Tampouco podia eu vagar pelas margens do dicionário. Tinha que me contentar com caracas, putz grila, caramba, droga, bobão e, nos piores casos, imbecil. Se chegava algo mais irreverente e ofensivo aos meus ouvidos pelas vozes de tios e companheiros libertinos, eu simplesmente não entendia o que podia significar. Só fui entender o que seria viadinho depois da terceira série e depois de ter concordado com um colega que apontou o fato de eu ser viadinho.
Foi no ônibus escolar. Eu estava especialmente bem humorado no dia e me divertia fazendo voz fina, o que não necessitava de muito esforço já que minha voz nunca foi lá muito grave. Achava engraçado a besteira. Depois comecei a chamar pelo nome de alguns colegas com essa voz. Um dos mais altos da série não gostou muito e declarou:
-Maior viadinho!
Eu não via problema nisso. E, como parecia irritar o garoto, subi alguns tons na escala musical para repetir “viadinho viadinho”. Não foi algo que contribuiu muito na minha vida escolar, certamente, mas viria a ser apagado por outras situações mais embaraçosas no decorrer da minha existência.
De qualquer forma, podem ver que eu não era descolado, muito menos esperto. O meu português não era culto o bastante, mas nada que me fizesse parecer o gangster ou qualquer coisa assim. Na verdade, eu mal falava. Às vezes tinha um surto de bobagem, como no caso do ônibus, só que era raro. Para o meu espanto, porém, um colega disse que eu era desbocado e voltei para casa com isso na cabeça.
Tentei refrear nas palavras, mas logo descobri os seus sentidos e aí é impossível evitar dizê-las, pois você percebe a possibilidade de exprimir toda uma gama de sentimentos nunca antes explorados. Pela primeira vez eu tinha algo a dizer dos professores, dos colegas idiotas e dos desenhos que eu gostava. Claro isso deu uma outra perspectiva aos “viadinhos” que volta e meia eu ouvia sendo referidos a minha pessoa. Daí eu podia dizer foda-se e sair por cima, caso alguém não mandasse um corroda-se, me deixando sem ação nenhuma.
Hoje, sou versado nos palavrões e não perco a chance de dizer um porra, na frente de quem puder. A grande merda é que a vida adulta traz toda uma nova série de sentimentos e problemas que não encontram equivalentes no meu Aurélio Marginal. Para esses novos tempos, se faz necessários palavrões à altura, muito mais pesados.
sábado, 21 de agosto de 2010
Dê respostas sem entender as perguntas
Volta e meia alguém perguntava a Daniel sua opinião sobre um assunto “O que você acha, o que você pensa sobre isso, tem certeza certeza disso?” Era uma chateação. Tinha de analisar causas e conseqüências tão caóticas que formavam um embaraçado de nós, do qual era impossível achar as pontas sem antes rever todo o conhecimento adquirido durante a vida. No final, depois de tanto esforço ainda tinha de reconhecer sua ignorância sobre o assunto.
Um dia, desesperado, pediu ajuda diante da difícil tarefa de exprimir seu pensamento pessoal.
-Socorro Socooorro – gritou.
-NADA TEMA!
Era o Senso-Comum, herói dos preguiçosos de raciocínio e dos conformistas oprimidos. Ele passou o braço pelos ombros de Daniel e lhe deu um sorriso amigável.
-Vamos lá, amigo, quer saber se o aborto deve ser permitido, se o controle de natalidade é a solução para a pobreza? Diga.
-Como faço para escolher o candidato a presidente?
-Fácil, oras! Ache uma celebridade que você goste, de preferência estrangeira (ou ao menos um brasileiro no exterior) e descubra em quem ela vai votar. Depois é só votar no mesmo candidato. Se tiver dificuldades, vote no candidato que der a melhor camisa.
-Poxa, obrigado, Senso-Comum! Agora me sinto muito melhor.
-De nada, amigão. Lembre-se, nunca deixe as vozes dentro de você falarem mais alto do que o som da TV ou da música no seu fone de ouvido! Adeus!
Um dia, desesperado, pediu ajuda diante da difícil tarefa de exprimir seu pensamento pessoal.
-Socorro Socooorro – gritou.
-NADA TEMA!
Era o Senso-Comum, herói dos preguiçosos de raciocínio e dos conformistas oprimidos. Ele passou o braço pelos ombros de Daniel e lhe deu um sorriso amigável.
-Vamos lá, amigo, quer saber se o aborto deve ser permitido, se o controle de natalidade é a solução para a pobreza? Diga.
-Como faço para escolher o candidato a presidente?
-Fácil, oras! Ache uma celebridade que você goste, de preferência estrangeira (ou ao menos um brasileiro no exterior) e descubra em quem ela vai votar. Depois é só votar no mesmo candidato. Se tiver dificuldades, vote no candidato que der a melhor camisa.
-Poxa, obrigado, Senso-Comum! Agora me sinto muito melhor.
-De nada, amigão. Lembre-se, nunca deixe as vozes dentro de você falarem mais alto do que o som da TV ou da música no seu fone de ouvido! Adeus!
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
-Então, ela estava ali parada me olhando com seus grandes olhos e eu a deixei ir.
-Fala sério! Porra, por que você não disse alguma coisa?
-Tipo o quê?
-Qualquer coisa!
-Não, seria inútil...
-Claro que não! Você podia dizer que a amava, podia falar como ela fazia você se sentir alegre toda manhã, podia... podia ter lhe dado um beijo apaixonado!
-Era só uma rã, cara. Tipo, seria meio estranho.
-Se você continuar tão seletivo, vai acabar ficando sozinho.
-Fala sério! Porra, por que você não disse alguma coisa?
-Tipo o quê?
-Qualquer coisa!
-Não, seria inútil...
-Claro que não! Você podia dizer que a amava, podia falar como ela fazia você se sentir alegre toda manhã, podia... podia ter lhe dado um beijo apaixonado!
-Era só uma rã, cara. Tipo, seria meio estranho.
-Se você continuar tão seletivo, vai acabar ficando sozinho.
sexta-feira, 23 de julho de 2010
Aluno Nota Zero Cap. 1
Deitado, com uma perna sobre o encosto do sofá, um braço protegendo os olhos da luz e o outro caído para fora do móvel, Renato tirava o seu merecido descanso pós-vestibular. Foram 3 anos de ensino médio, de conversas sérias sobre o futuro, de aulas incansáveis, de estresse e de um terrível esforço para fingir que estudava. Renato se preocupava com os pais, por isso sempre andava com algum livro a tira colo. Se em algum momento eles chegassem perto, era só pegar o livro e começar a escrever números sem nenhuma razão. Assim, todo mundo cumpria a sua obrigação e ficava por satisfeito.
Mas esses dias acabaram. Renato agora não tinha nenhum livro por perto, a não ser que você chame a revista da TV a cabo de livro. E, segundo os seus cálculos, que precisamente por estarem sempre errados, ele devia estar fora de qualquer universidade para qual tenha tentado. Pela frente estavam as maiores férias de sua vida, com final somente quando um dos seus pais decidirem pagar as contas de uma universidade particular. Daí, só teria que fingir ler livros maiores ou qualquer coisa do tipo. Nada demais. Até lá, a vida se resumia aos amigos sofá e TV.
Foi de imensa surpresa, então, quando sua mãe irrompeu pela sala, com uma carta nas mãos que, segundo ela, anunciava a sua classificação numa faculdade.
Dias atrás, Longe dali, no prédio da reitoria da Universidade Municipal do Estado do Rio de Janeiro II (a primeira universidade, uma cidade criada para receber as maiores mentes do país, foi um projeto exemplar, mas infelizmente construído numa área de riscos de desmoronamento. A aula inaugural ocorreu num dia chuvoso, causando um desastre que destruiu as instalações e matou o único professor que não havia faltado ao primeiro dia de aula) Um técnico administrativo se dedicava arduamente em seu computador a se distrair de seu trabalho que era registrar as fichas dos classificados no vestibular e, não, ver os últimos detalhes da anatomia de uma adolescente de roupas íntimas.
O barulho de passos se aproximando e o nariz protuberante do coordenador do setor despontando pela porta interromperam os seus estudos, forçando o técnico a dar adeus a Carlinha Sapeca e fechar a janela no seu micro com cliques frenéticos do mouse. Depois de uma janela de aumento peniano e outra de rede de relacionamentos, surgiu a janela com UMERJ2 no topo e os dados de Renato Franco Sousa com um série de notas zero, em vermelho, numa tabela. Abaixo, havia um botão cinza com Inscrever em destaque.
-Então, como anda o trabalho? Já terminou de colocar os nomes nos sistemas? – falou o coordenador passando por ele e colocando sua pasta em cima de uma cadeira desocupada.
-To quase acabando. – respondeu o técnico administrativo, sem prestar atenção que havia acabado de inscrever o último lugar do vestibular.
-Renato, você passou para UMERJ!!
-Hum?
-Não ta ouvindo não?
-Que foi, mãe?
-Você passou na UMERJ
-Passei o quê?!- Renato ficou com medo de ter dado um tom de surpresa um pouco maior do que o necessário, tentou controlar o seu terror. – Como assim passei?
-Na UMERJ... Ta surdo? Olha aqui a carta.
Renato tirou o envelope das mãos de sua mãe. Já estava aberto, por isso só precisou tirar a carta do envelope e desdobrá-la. Antes de ler , observou desconfiado sua mãe. Se aquilo era uma brincadeira, estavam brincando pesado.
-A UMERJ II tem o prazer de anunciar a classificação de Renato Franco Sousa.- a voz de Renato sumiu enquanto havia tempo, deixando para trás a boca aberta e trêmula.
-Parabéns, filhão! – disse a mãe, abraçando a estátua de pedra que tomou o lugar de seu filho – Espera só até contar o resto da família! E a sua avó achava que eu era incapaz de te colocar numa escola que não fosse de meninos especiais!
Renato tentou expressar algum tipo de animação, mas o esforço só o fez perder o controle das pernas e assim que sua mãe o largou, ele desabou no sofá.
Mas esses dias acabaram. Renato agora não tinha nenhum livro por perto, a não ser que você chame a revista da TV a cabo de livro. E, segundo os seus cálculos, que precisamente por estarem sempre errados, ele devia estar fora de qualquer universidade para qual tenha tentado. Pela frente estavam as maiores férias de sua vida, com final somente quando um dos seus pais decidirem pagar as contas de uma universidade particular. Daí, só teria que fingir ler livros maiores ou qualquer coisa do tipo. Nada demais. Até lá, a vida se resumia aos amigos sofá e TV.
Foi de imensa surpresa, então, quando sua mãe irrompeu pela sala, com uma carta nas mãos que, segundo ela, anunciava a sua classificação numa faculdade.
***
Dias atrás, Longe dali, no prédio da reitoria da Universidade Municipal do Estado do Rio de Janeiro II (a primeira universidade, uma cidade criada para receber as maiores mentes do país, foi um projeto exemplar, mas infelizmente construído numa área de riscos de desmoronamento. A aula inaugural ocorreu num dia chuvoso, causando um desastre que destruiu as instalações e matou o único professor que não havia faltado ao primeiro dia de aula) Um técnico administrativo se dedicava arduamente em seu computador a se distrair de seu trabalho que era registrar as fichas dos classificados no vestibular e, não, ver os últimos detalhes da anatomia de uma adolescente de roupas íntimas.
O barulho de passos se aproximando e o nariz protuberante do coordenador do setor despontando pela porta interromperam os seus estudos, forçando o técnico a dar adeus a Carlinha Sapeca e fechar a janela no seu micro com cliques frenéticos do mouse. Depois de uma janela de aumento peniano e outra de rede de relacionamentos, surgiu a janela com UMERJ2 no topo e os dados de Renato Franco Sousa com um série de notas zero, em vermelho, numa tabela. Abaixo, havia um botão cinza com Inscrever em destaque.
-Então, como anda o trabalho? Já terminou de colocar os nomes nos sistemas? – falou o coordenador passando por ele e colocando sua pasta em cima de uma cadeira desocupada.
-To quase acabando. – respondeu o técnico administrativo, sem prestar atenção que havia acabado de inscrever o último lugar do vestibular.
***
-Renato, você passou para UMERJ!!
-Hum?
-Não ta ouvindo não?
-Que foi, mãe?
-Você passou na UMERJ
-Passei o quê?!- Renato ficou com medo de ter dado um tom de surpresa um pouco maior do que o necessário, tentou controlar o seu terror. – Como assim passei?
-Na UMERJ... Ta surdo? Olha aqui a carta.
Renato tirou o envelope das mãos de sua mãe. Já estava aberto, por isso só precisou tirar a carta do envelope e desdobrá-la. Antes de ler , observou desconfiado sua mãe. Se aquilo era uma brincadeira, estavam brincando pesado.
-A UMERJ II tem o prazer de anunciar a classificação de Renato Franco Sousa.- a voz de Renato sumiu enquanto havia tempo, deixando para trás a boca aberta e trêmula.
-Parabéns, filhão! – disse a mãe, abraçando a estátua de pedra que tomou o lugar de seu filho – Espera só até contar o resto da família! E a sua avó achava que eu era incapaz de te colocar numa escola que não fosse de meninos especiais!
Renato tentou expressar algum tipo de animação, mas o esforço só o fez perder o controle das pernas e assim que sua mãe o largou, ele desabou no sofá.
domingo, 11 de julho de 2010
Impactos psicológicos da Copa
Concentrados, a família assistia ao jogo do Brasil na Copa. Estava difícil. Os atacantes chegavam na área adversária, mas nada da bola ir para o gol. Ia para todo lugar, chegou até a acertar a cabeça de um fotógrafo que viu pela câmera, uma bola se aproximar, até virar um close e lhe atingir em cheio na cara. A baliza indiferente repousava intocável.
Na família já se repercutiam xingamentos a tudo e a todos, principalmente do tio que tomava cerveja como se fosse remédio. Não foi para tanto que, quando então, abençoado pelos Deuses do futebol, Robinho meteu um chute bonito no ângulo. Todos ergueram-se da cadeira, como uma onda prestes a engolir uma cidade. A onda, contudo, não desabou. Todos estacaram, a boca aberta preparada para um grito que não saía, as mãos fechadas no meio do caminho de irem aos céus e os olhos esbugalhados em cima do tio, o único a comemorar. O tio, do alto de seu êxtase, de repente percebeu algo de estranho na falta de reação dos outros.
-Que isso, gente? Porra, foi gol do brasil!
Nada as pessoas pareciam chocadas. A mulher balbuciou algumas palavras, sem chegar a fazer sentido.
-Onde está o espírito patriótico de vocês?!
Suas reclamações não tiveram efeitos.
Um sobrinho molecão chegou do banheiro correndo, desafiando tempo e espaço, para ver o gol. Não chegou a ver. Antes de avistar a TV, viu o tio antes e pôs-se a rir desenfreadamente.
-Olha a calça do tio!
Aquilo pareceu quebrar o feitiço. Os espectadores saíram de seu congelamento e passaram à chacota.
-Opa, um jogador acabou de entrar em campo... – falou o dono da casa acotevelando de maneira cúmplice um amigo.
-Sérgio, na cama você não tem essa disposição - disse a mulher do tio, ainda chocada, porém mais ofendida.
O tio olhou para baixo, e encolheu-se rápido no sofá, tomando em mãos a almofada para bem próximo de si. A copa havia terminado, pelo menos para a sua masculinidade.
O analista, no dia seguinte, observou:
- Jogos de futebol despertam os desejos mais primitivos dos homens, sendo o desejo sexual um deles. Na verdade, assistir um jogo não é muito diferente de...
A frase se perdeu na cabeça tumultuada do tio. Não tinha como aquilo ser normal! De hoje em diante, nunca mais esportes!
E assim foi. Muito embora a partir daí era a mulher que insistia em assistir jogo de futebol à noite no lugar de novela. Por que será?
Na família já se repercutiam xingamentos a tudo e a todos, principalmente do tio que tomava cerveja como se fosse remédio. Não foi para tanto que, quando então, abençoado pelos Deuses do futebol, Robinho meteu um chute bonito no ângulo. Todos ergueram-se da cadeira, como uma onda prestes a engolir uma cidade. A onda, contudo, não desabou. Todos estacaram, a boca aberta preparada para um grito que não saía, as mãos fechadas no meio do caminho de irem aos céus e os olhos esbugalhados em cima do tio, o único a comemorar. O tio, do alto de seu êxtase, de repente percebeu algo de estranho na falta de reação dos outros.
-Que isso, gente? Porra, foi gol do brasil!
Nada as pessoas pareciam chocadas. A mulher balbuciou algumas palavras, sem chegar a fazer sentido.
-Onde está o espírito patriótico de vocês?!
Suas reclamações não tiveram efeitos.
Um sobrinho molecão chegou do banheiro correndo, desafiando tempo e espaço, para ver o gol. Não chegou a ver. Antes de avistar a TV, viu o tio antes e pôs-se a rir desenfreadamente.
-Olha a calça do tio!
Aquilo pareceu quebrar o feitiço. Os espectadores saíram de seu congelamento e passaram à chacota.
-Opa, um jogador acabou de entrar em campo... – falou o dono da casa acotevelando de maneira cúmplice um amigo.
-Sérgio, na cama você não tem essa disposição - disse a mulher do tio, ainda chocada, porém mais ofendida.
O tio olhou para baixo, e encolheu-se rápido no sofá, tomando em mãos a almofada para bem próximo de si. A copa havia terminado, pelo menos para a sua masculinidade.
O analista, no dia seguinte, observou:
- Jogos de futebol despertam os desejos mais primitivos dos homens, sendo o desejo sexual um deles. Na verdade, assistir um jogo não é muito diferente de...
A frase se perdeu na cabeça tumultuada do tio. Não tinha como aquilo ser normal! De hoje em diante, nunca mais esportes!
E assim foi. Muito embora a partir daí era a mulher que insistia em assistir jogo de futebol à noite no lugar de novela. Por que será?
quarta-feira, 16 de junho de 2010
O que acontece quando se escuta a sua mãe
Teatro é uma das grandes formas de arte. Para mim, sempre foi mais uma forma de sadomasoquismo. Não estou querendo dizer que assisto peças com roupa de couro e um chicote. A metáfora – ok, devo dizer, não é muito boa – significa que as poucas montagens que eu assisti na minha vida eram um tanto escrotas. Para começar, aquelas da época da época da escolinha. Vinha lá um grupo de 3 pessoas maquiadas, com alguma história onde a moral, uma hora ou outra, era explicitamente dita por um dos personagens em alguma parte do fim. E pior, os diretores eram tão ruins, que os personagens tinham de perguntar para crianças onde estava o vilão, ou o vilão, onde estava o mocinho. Crianças recém alfabetizadas decidiam o futuro do elenco. O que Aristóteles diria quanto a isso? Talvez “Ali! ele foi para ali!”
Depois, eu fui a um teatro de verdade, o Miguel Falabella. O lugar para onde vai o pessoal da Globo que não consegue arranjar trabalho em novela. É uma espécie de purgatório televisivo o teatro, se parar para pensar. Enfim, os traumas produzidos por Falabella foram minimizados pelo fato de eu ainda ser criança e não ligar tanto para enredo e essas coisas, afinal eu assistia Cavaleiros do Zodíaco. Mas não há limites de idade para se odiar Boom.
Boom é um monólogo de uma hora com um gorducho chamado Jorge Fernando – vocês devem saber quem é, dirige para a Globo. Esse tal Jorge Fernando, um rapaz muito original, tira as suas piadas do fato de ser um homem gordo vestido de roupas femininas. E é isso. Gostaria de falar mais, só não há palavras para explicar. O pior da comédia ficou concentrado como colesterol na veia do ator. Tinha piadas de gay, palavrão, arroto, peido, sabe-se lá mais o que. Uma coisa eu tenho certeza: não havia nenhuma criança recém-alfabetetizada para dar pitacos no roteiro. Se tivesse, sairia bem melhor.
Deixemos isso de lado e vamos dar um salto no tempo. Estou divagando para chegar ao último sábado, 29 de maio de 2010, quando eu provei não ter aprendido com as minhas experiências anteriores. Onde eu moro, o Méier, não é um bairro conhecido por sua efervescência cultural. Aqui as pessoas estão felizes com futebol na TV e uma novela antes de dormir. O máximo que se chega é o norte shopping com seus cinemas e o infame Miguel Falabella. Mas isso não é totalmente verdade porque:
-Vocês sabiam que tem um teatro perto dos bombeiros – disse a minha mãe. E note, ter um teatro perto dos bombeiros não é um bom sinal.
-Ah sim, acho que já vi. – disse eu, lembrando-me – é no outro lado do Méier, depois do viaduto, né?
-É sim. É bem grande - disse minha mãe, pintando um Coliseu – Deve ser legal! Querem ir?
O meu irmão já foi negando logo de cara, apesar de explicitar o meu desejo de ir. Fiz que não timidamente com a cabeça. Minha mãe insistiu, cometendo o erro de contar sobre o enredo da produção. Era a história do milagre de Fátima. Tive ânsia de vômito na hora. O problema é que, se eu não fosse, a minha mãe iria sozinha para um lugar quase debaixo de um viaduto, perto do corpo de bombeiros, à noite. O meu espírito, sempre nobre, venceu. Acabei indo.
O lugar parecia qualquer coisa, menos teatro. O primeiro andar era quase um depósito de tão grande e alto. A decoração era no estilo cozinha da vovó. Aqui e ali tinha umas mesas cobertas por alguma toalhinha sobre onde repousavam pequenos jarros de flores falsas ou secas. Também, para indicar a qualidade artística da casa, a parede da direita e as pilastras carregavam quadros com temas bucólicos e totalmente distantes da realidade brasileira. Um casebre no meio de um campo verde, rios, barquinhos, uma camponesa nua, essas coisas. Até a minha mãe havia de concordar que era bem brega. Mas dá para se entender quando você vê chegar o público do lugar, um monte de velhinhos e velhinhas frescos da missa em alguma igreja por perto.
Eles entraram e aprovaram de imediato a decoração. Alguns olhavam a pintura com tanta concentração e reflexão que você quase acreditaria que a pessoa realmente morou num casebre num campo, no meio da Europa.
-Muito bonito, né? – diziam.
Demorou quase uma hora até podermos de fato entrar. Subimos a longa escada de aço até o 2º piso, onde nos esperava o palco e o tédio. Sim, porque houve uma espera de uma hora para começar a peça. Prevista para iniciar às 6:30, começou às 8:00. Tivemos que ficar no hall, enquanto não abriam as cortinas. Ali tinha um bar com jeitão de cozinha. Tinha esses armários embutidos e fogão. Também havia algumas mesas para se sentar, mas eram poucas, de modo que ficamos em pé, naquele espaço mal iluminado, imprensados pelo teto que tinha menos da minha altura com o braço levantado. Se você quisesse espaço, teria de sair para a área que dava para os banheiros, decorada elegantemente com pinturas de floresta tropical. Incluindo um tapete imitando graminha. Sim, a arquitetura era capaz de transformar um decorador gay em purpurina instantaneamente.
Quando eu e a minha mãe já estávamos perto de uma crise de claustrofobia, as cortinas vermelhas abriram. Passamos pelo portal e nos vimos em outro nível de breguice. Chão coberto de um plástico xadrez, branco e preto! A não ser que você seja uma lanchonete dos anos 50, não há nenhuma razão para ostentar piso xadrez. O clima sobrenatural era dado pelo gelo seco com cheiro de incenso e refletores com as cores do arco-íris. Isso mesmo. Você deve estar se perguntando se era uma boate gay. Bem, me perguntei a mesma coisa quando vi uma globos espelhados feitos para refletir luz em festa, da época que Menudos era algo capaz de ser cogitado. Segundo minha mãe, ali também funcionava como salão de danças em alguns dias. Imagine os freqüentadores... Fiquei quieto na minha cadeira de plástico. Ah sim, você se sentava em cadeiras de plásticos, iguais a essas usadas em festa de aniversário em casa para deixar o pessoal confortável enquanto comem os seus salgadinhos frios.
Não vou falar muito da peça em si. Eu sei. Então pra que todo esse blabla, lerolero? Basta dizer que era praticamente como ouvir a minha avó rezando de manhã. Todo esse papo de fé, penitência e chatice que todos estamos acostumados. Minha fala favorita é quando perguntam se a Santa pode ajudar a curar não sei quem. Ela chega e diz “Se ele se converter...”. Não é ótimo essa barganha religiosa? E o pior mesmo são adultos interpretando crianças. Por que fazem isso em teatro, cara? É impossível não lembrar de Chaves! Fica tosco. Por mim, ou tentam colocar crianças ou não colocam. Eu fico com vergonha.
A 1:30h de duração do Milagre do Sol(esse era o nome), pareceu muito mais longo do que os mais de 13 anos que levaram para que o tal segredo fosse revelado. Mas, como o tempo é relativo, minha mãe o viu até passar rápido e achou a história agradável e emocionante. Eu pensei, vontade de rir é uma emoção? Nossas diferenças críticas foram esquecidas, quando a minha mãe pagou um cachorro quente completo para gente. Aí, me vendi mesmo, roguei que aquilo era um milagre e agradeci a Fátima pelo meu pedaço de colesterol embalado em carboidratos. Porém, como os céus não devem ter acesso à internet, vim ao meu blog blasfemar.
Continuo a espera do teatro prometido, que me faça ver de que não só quadrinhos, livros e filmes se é feito narrativas. Mas até agora tem exigido mais fé do que qualquer providência divina.
Depois, eu fui a um teatro de verdade, o Miguel Falabella. O lugar para onde vai o pessoal da Globo que não consegue arranjar trabalho em novela. É uma espécie de purgatório televisivo o teatro, se parar para pensar. Enfim, os traumas produzidos por Falabella foram minimizados pelo fato de eu ainda ser criança e não ligar tanto para enredo e essas coisas, afinal eu assistia Cavaleiros do Zodíaco. Mas não há limites de idade para se odiar Boom.
Boom é um monólogo de uma hora com um gorducho chamado Jorge Fernando – vocês devem saber quem é, dirige para a Globo. Esse tal Jorge Fernando, um rapaz muito original, tira as suas piadas do fato de ser um homem gordo vestido de roupas femininas. E é isso. Gostaria de falar mais, só não há palavras para explicar. O pior da comédia ficou concentrado como colesterol na veia do ator. Tinha piadas de gay, palavrão, arroto, peido, sabe-se lá mais o que. Uma coisa eu tenho certeza: não havia nenhuma criança recém-alfabetetizada para dar pitacos no roteiro. Se tivesse, sairia bem melhor.
Deixemos isso de lado e vamos dar um salto no tempo. Estou divagando para chegar ao último sábado, 29 de maio de 2010, quando eu provei não ter aprendido com as minhas experiências anteriores. Onde eu moro, o Méier, não é um bairro conhecido por sua efervescência cultural. Aqui as pessoas estão felizes com futebol na TV e uma novela antes de dormir. O máximo que se chega é o norte shopping com seus cinemas e o infame Miguel Falabella. Mas isso não é totalmente verdade porque:
-Vocês sabiam que tem um teatro perto dos bombeiros – disse a minha mãe. E note, ter um teatro perto dos bombeiros não é um bom sinal.
-Ah sim, acho que já vi. – disse eu, lembrando-me – é no outro lado do Méier, depois do viaduto, né?
-É sim. É bem grande - disse minha mãe, pintando um Coliseu – Deve ser legal! Querem ir?
O meu irmão já foi negando logo de cara, apesar de explicitar o meu desejo de ir. Fiz que não timidamente com a cabeça. Minha mãe insistiu, cometendo o erro de contar sobre o enredo da produção. Era a história do milagre de Fátima. Tive ânsia de vômito na hora. O problema é que, se eu não fosse, a minha mãe iria sozinha para um lugar quase debaixo de um viaduto, perto do corpo de bombeiros, à noite. O meu espírito, sempre nobre, venceu. Acabei indo.
O lugar parecia qualquer coisa, menos teatro. O primeiro andar era quase um depósito de tão grande e alto. A decoração era no estilo cozinha da vovó. Aqui e ali tinha umas mesas cobertas por alguma toalhinha sobre onde repousavam pequenos jarros de flores falsas ou secas. Também, para indicar a qualidade artística da casa, a parede da direita e as pilastras carregavam quadros com temas bucólicos e totalmente distantes da realidade brasileira. Um casebre no meio de um campo verde, rios, barquinhos, uma camponesa nua, essas coisas. Até a minha mãe havia de concordar que era bem brega. Mas dá para se entender quando você vê chegar o público do lugar, um monte de velhinhos e velhinhas frescos da missa em alguma igreja por perto.
Eles entraram e aprovaram de imediato a decoração. Alguns olhavam a pintura com tanta concentração e reflexão que você quase acreditaria que a pessoa realmente morou num casebre num campo, no meio da Europa.
-Muito bonito, né? – diziam.
Demorou quase uma hora até podermos de fato entrar. Subimos a longa escada de aço até o 2º piso, onde nos esperava o palco e o tédio. Sim, porque houve uma espera de uma hora para começar a peça. Prevista para iniciar às 6:30, começou às 8:00. Tivemos que ficar no hall, enquanto não abriam as cortinas. Ali tinha um bar com jeitão de cozinha. Tinha esses armários embutidos e fogão. Também havia algumas mesas para se sentar, mas eram poucas, de modo que ficamos em pé, naquele espaço mal iluminado, imprensados pelo teto que tinha menos da minha altura com o braço levantado. Se você quisesse espaço, teria de sair para a área que dava para os banheiros, decorada elegantemente com pinturas de floresta tropical. Incluindo um tapete imitando graminha. Sim, a arquitetura era capaz de transformar um decorador gay em purpurina instantaneamente.
Quando eu e a minha mãe já estávamos perto de uma crise de claustrofobia, as cortinas vermelhas abriram. Passamos pelo portal e nos vimos em outro nível de breguice. Chão coberto de um plástico xadrez, branco e preto! A não ser que você seja uma lanchonete dos anos 50, não há nenhuma razão para ostentar piso xadrez. O clima sobrenatural era dado pelo gelo seco com cheiro de incenso e refletores com as cores do arco-íris. Isso mesmo. Você deve estar se perguntando se era uma boate gay. Bem, me perguntei a mesma coisa quando vi uma globos espelhados feitos para refletir luz em festa, da época que Menudos era algo capaz de ser cogitado. Segundo minha mãe, ali também funcionava como salão de danças em alguns dias. Imagine os freqüentadores... Fiquei quieto na minha cadeira de plástico. Ah sim, você se sentava em cadeiras de plásticos, iguais a essas usadas em festa de aniversário em casa para deixar o pessoal confortável enquanto comem os seus salgadinhos frios.
Não vou falar muito da peça em si. Eu sei. Então pra que todo esse blabla, lerolero? Basta dizer que era praticamente como ouvir a minha avó rezando de manhã. Todo esse papo de fé, penitência e chatice que todos estamos acostumados. Minha fala favorita é quando perguntam se a Santa pode ajudar a curar não sei quem. Ela chega e diz “Se ele se converter...”. Não é ótimo essa barganha religiosa? E o pior mesmo são adultos interpretando crianças. Por que fazem isso em teatro, cara? É impossível não lembrar de Chaves! Fica tosco. Por mim, ou tentam colocar crianças ou não colocam. Eu fico com vergonha.
A 1:30h de duração do Milagre do Sol(esse era o nome), pareceu muito mais longo do que os mais de 13 anos que levaram para que o tal segredo fosse revelado. Mas, como o tempo é relativo, minha mãe o viu até passar rápido e achou a história agradável e emocionante. Eu pensei, vontade de rir é uma emoção? Nossas diferenças críticas foram esquecidas, quando a minha mãe pagou um cachorro quente completo para gente. Aí, me vendi mesmo, roguei que aquilo era um milagre e agradeci a Fátima pelo meu pedaço de colesterol embalado em carboidratos. Porém, como os céus não devem ter acesso à internet, vim ao meu blog blasfemar.
Continuo a espera do teatro prometido, que me faça ver de que não só quadrinhos, livros e filmes se é feito narrativas. Mas até agora tem exigido mais fé do que qualquer providência divina.
sábado, 5 de junho de 2010
Regresso
Estava escuro.
Apenas uma luz, vinda de muito longe entrava na brecha das cortinas e cortava o quarto como uma lâmina. O garoto seguiu com as vistas o caminho da lâmina da janela até a parede oposta. Tentou dormir novamente. Sem sucesso, esperou os olhos se acostumarem com a escuridão, até o mundo se revelar para ele. Ali parado, lhe pareceu a eternidade. Quando conseguiu distinguir os contornos da televisão e do armário e dos demais objetos, levantou-se e seguiu devagar até a porta. Imaginou que ao passar pelo fio claro no meio do caminho seria dividido em dois. Com muito cuidado levantou o pé por cima como se fosse uma armadilha na selva. Depois, passou o outro por cima com igual cuidado. Pensou na própria besteira e sorriu.Abriu a porta.
No corredor, ouvia o grunhir dos roncos vindos dos quartos dos pais. Os dinossauros deviam provavelmente soar assim. Um outro som também estava presente. Parecia uma batida. Talvez um pingo d’água caindo da torneira. Verificou o banheiro. Estava tudo ok. Aproveitou para mijar, e em seguida rumou para a cozinha, atravessando a sala de estar. Lá também não havia sinal de desperdício de água. A terra estava a salvo. Pensou em como a mãe ficava desesperada e não parava de tagarelar sobre o aquecimento global. Se ela te pegasse escovando os dentes sem um copo, tinha um ataque e você se tornava o grande vilão. O garoto achava difícil algo tão grande como o mundo pudesse acabar de uma hora para outra. Pegou um copo dágua e decidiu esquecer a batida, embora ela parecesse querer lhe lembrar de algo muito importante e antigo. Foda-se estava mais preocupado se ganharia o vídeo game ou não no seu aniversário, se veria a garota que gostava na aula de amanhã, qualquer coisa menos aquele som.
Tomou gole de água, enquanto caminhava para a janela, na sala, que dava para a rua. Sentiu uma brisa muito leve e quente chegar ao seu rosto, tentando num esforço balançar os seus cabelos e desistindo no seu caminho. A noite estava nublada, sem estrelas ou lua, só um azul sujo num céu fosco. Sempre diziam que coisas horríveis aconteciam à noite. Assaltos, seqüestros, assassinatos, estupros, brigas e outras coisas da qual sempre falam os jornais. Mas para ele, do alto de seu quarto andar, nada parecia acontecer. Apenas árvores, ruas, prédios, a noite... e a batida ritmada que parecia estar mais alta.
Quando olhou mais para baixo, notou que um homem o observava. Ele estava no meio da rua, vindo sabe-se lá da onde e era pouco mais que um vulto. Sentiu-se gelar, mas o que aquele homem poderia fazer lá embaixo. Ficou quieto, tentou ser durão e indiferente. O homem só ficava ali parado, o rosto voltado para ele. Tinha algo de estranho, mas não conseguiu discernir logo o que era.
Primeiro achou que estava enxergando mal. O rosto do homem era vazio, como se a espera de alguém para modelá-lo, como um adão esquecido pelo criador. O garoto deu um passo para trás. A batida se tornava mais forte e água do copo se agitava.Um vento forte ergueu as cortinas, fez cair porta retratos e tremer os pêlos do seu corpo. Aquilo era muito diferente da brisa quente noturna. Algo passara voando lá fora. Algo grande.
E a batida ressoava agora nas paredes e no seu cérebro, retumbando uma mensagem esquecida. Lá fora das trevas, seres estranhos saíam, seres desmembrados e que pareciam estar no extremo oposto da cadeia evolutiva. Havia coisas que pareciam mistura de animais e que corriam alegres e magras e famintas. Subiam pelas paredes e entravam pelas janelas de apartamentos. Sombras gigantes se formaram contra o céu, montanhas que se mexiam e usavam a Terra como seu tambor. O garoto podia gritar, mas não adiantava. A mensagem estava clara. Os monstros haviam voltados. Os humanos estavam expulsos do paraíso.
Apenas uma luz, vinda de muito longe entrava na brecha das cortinas e cortava o quarto como uma lâmina. O garoto seguiu com as vistas o caminho da lâmina da janela até a parede oposta. Tentou dormir novamente. Sem sucesso, esperou os olhos se acostumarem com a escuridão, até o mundo se revelar para ele. Ali parado, lhe pareceu a eternidade. Quando conseguiu distinguir os contornos da televisão e do armário e dos demais objetos, levantou-se e seguiu devagar até a porta. Imaginou que ao passar pelo fio claro no meio do caminho seria dividido em dois. Com muito cuidado levantou o pé por cima como se fosse uma armadilha na selva. Depois, passou o outro por cima com igual cuidado. Pensou na própria besteira e sorriu.Abriu a porta.
No corredor, ouvia o grunhir dos roncos vindos dos quartos dos pais. Os dinossauros deviam provavelmente soar assim. Um outro som também estava presente. Parecia uma batida. Talvez um pingo d’água caindo da torneira. Verificou o banheiro. Estava tudo ok. Aproveitou para mijar, e em seguida rumou para a cozinha, atravessando a sala de estar. Lá também não havia sinal de desperdício de água. A terra estava a salvo. Pensou em como a mãe ficava desesperada e não parava de tagarelar sobre o aquecimento global. Se ela te pegasse escovando os dentes sem um copo, tinha um ataque e você se tornava o grande vilão. O garoto achava difícil algo tão grande como o mundo pudesse acabar de uma hora para outra. Pegou um copo dágua e decidiu esquecer a batida, embora ela parecesse querer lhe lembrar de algo muito importante e antigo. Foda-se estava mais preocupado se ganharia o vídeo game ou não no seu aniversário, se veria a garota que gostava na aula de amanhã, qualquer coisa menos aquele som.
Tomou gole de água, enquanto caminhava para a janela, na sala, que dava para a rua. Sentiu uma brisa muito leve e quente chegar ao seu rosto, tentando num esforço balançar os seus cabelos e desistindo no seu caminho. A noite estava nublada, sem estrelas ou lua, só um azul sujo num céu fosco. Sempre diziam que coisas horríveis aconteciam à noite. Assaltos, seqüestros, assassinatos, estupros, brigas e outras coisas da qual sempre falam os jornais. Mas para ele, do alto de seu quarto andar, nada parecia acontecer. Apenas árvores, ruas, prédios, a noite... e a batida ritmada que parecia estar mais alta.
Quando olhou mais para baixo, notou que um homem o observava. Ele estava no meio da rua, vindo sabe-se lá da onde e era pouco mais que um vulto. Sentiu-se gelar, mas o que aquele homem poderia fazer lá embaixo. Ficou quieto, tentou ser durão e indiferente. O homem só ficava ali parado, o rosto voltado para ele. Tinha algo de estranho, mas não conseguiu discernir logo o que era.
Primeiro achou que estava enxergando mal. O rosto do homem era vazio, como se a espera de alguém para modelá-lo, como um adão esquecido pelo criador. O garoto deu um passo para trás. A batida se tornava mais forte e água do copo se agitava.Um vento forte ergueu as cortinas, fez cair porta retratos e tremer os pêlos do seu corpo. Aquilo era muito diferente da brisa quente noturna. Algo passara voando lá fora. Algo grande.
E a batida ressoava agora nas paredes e no seu cérebro, retumbando uma mensagem esquecida. Lá fora das trevas, seres estranhos saíam, seres desmembrados e que pareciam estar no extremo oposto da cadeia evolutiva. Havia coisas que pareciam mistura de animais e que corriam alegres e magras e famintas. Subiam pelas paredes e entravam pelas janelas de apartamentos. Sombras gigantes se formaram contra o céu, montanhas que se mexiam e usavam a Terra como seu tambor. O garoto podia gritar, mas não adiantava. A mensagem estava clara. Os monstros haviam voltados. Os humanos estavam expulsos do paraíso.
segunda-feira, 24 de maio de 2010
Eleito!
Parado no vão da porta meu irmão vem anunciar:
-Você vai ser padrinho.
-Quer dizer que vou ter o direito de escolher uma mulher no casamento para levar para cama?
-Você vai ser padrinho, não rei medieval.
-Ah. Então o que o padrinho faz?
-Só fica parado lá, de terno.
-E eu não posso ficar aqui só?
Após ele detalhar mais o meu papel, ou mais precisamente a forma peculiar de fazer nada, entendi que padrinho será o mais próximo de um cargo político que chegarei. Ambos usam terno, ambos fazem nada. Com exceção do padrinho ao menos comparecer a plenária.
-Você vai ser padrinho.
-Quer dizer que vou ter o direito de escolher uma mulher no casamento para levar para cama?
-Você vai ser padrinho, não rei medieval.
-Ah. Então o que o padrinho faz?
-Só fica parado lá, de terno.
-E eu não posso ficar aqui só?
Após ele detalhar mais o meu papel, ou mais precisamente a forma peculiar de fazer nada, entendi que padrinho será o mais próximo de um cargo político que chegarei. Ambos usam terno, ambos fazem nada. Com exceção do padrinho ao menos comparecer a plenária.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
O analista sincero
-Então, você quer dizer que o motivo pelo qual eu não consigo ser bem sucedido na vida e de não ter autoconfiança é porque...
-Você é um idiota.-diz o analista sentado de pernas cruzadas em sua poltrona.
A fala dá lugar ao silêncio constrangedor só quebrado pelas anotações do analista em seu bloquinho.
-Hum- tento de novo- Assim, eu meio esperava que você fosse dizer que eu tenho um problema comum que pode ser muito bem superado. Que não há nada de errado comigo...
-Ah não não. – ele balança a cabeça – Veja bem, você é um completo idiota. Não há nada que eu posso fazer.
-Eu... eu não sei nem o que falar.
-E eu nem esperava isso.-concorda o doutor, sem parar de anotar no seu caderninho- na verdade, meu caro, eu me surpreendo até que você consiga juntar palavras.
-Não acha que está sendo meio grosso? Quer dizer, eu não o pago para falar mal de mim.
O doutor pára de escrever e olha para onde estou. Ele ajeita os óculos e eu, em provocação, ajeito os óculos com mais força. A coisa toda não surte o efeito desejado e acabo machucando os meus olhos.
-Que bom que você tocou nesse assunto. – ele diz - A partir de agora as consultas serão mais caras.
-Mais caras?
-Sim. Um aumento de R$ 1500,00. Pela perda de tempo que você representa.
-Isso é um absurdo. Isso dá...- Penso um pouco – Muito.
-R$ 4.800,00. Não gaste os últimos neurônios à toa.
Eu levanto.
-Gasto os meus neurônios como quiser, menos com uma terapia vagabunda dessas.
-Tudo bem, tudo bem. Você faz o que quiser. Mas eu aconselharia se tacar do alto de um prédio. Até logo!
-Você é um idiota.-diz o analista sentado de pernas cruzadas em sua poltrona.
A fala dá lugar ao silêncio constrangedor só quebrado pelas anotações do analista em seu bloquinho.
-Hum- tento de novo- Assim, eu meio esperava que você fosse dizer que eu tenho um problema comum que pode ser muito bem superado. Que não há nada de errado comigo...
-Ah não não. – ele balança a cabeça – Veja bem, você é um completo idiota. Não há nada que eu posso fazer.
-Eu... eu não sei nem o que falar.
-E eu nem esperava isso.-concorda o doutor, sem parar de anotar no seu caderninho- na verdade, meu caro, eu me surpreendo até que você consiga juntar palavras.
-Não acha que está sendo meio grosso? Quer dizer, eu não o pago para falar mal de mim.
O doutor pára de escrever e olha para onde estou. Ele ajeita os óculos e eu, em provocação, ajeito os óculos com mais força. A coisa toda não surte o efeito desejado e acabo machucando os meus olhos.
-Que bom que você tocou nesse assunto. – ele diz - A partir de agora as consultas serão mais caras.
-Mais caras?
-Sim. Um aumento de R$ 1500,00. Pela perda de tempo que você representa.
-Isso é um absurdo. Isso dá...- Penso um pouco – Muito.
-R$ 4.800,00. Não gaste os últimos neurônios à toa.
Eu levanto.
-Gasto os meus neurônios como quiser, menos com uma terapia vagabunda dessas.
-Tudo bem, tudo bem. Você faz o que quiser. Mas eu aconselharia se tacar do alto de um prédio. Até logo!
sábado, 15 de maio de 2010
Modo pseudo-intelectual ativar
Objeto de arte é um erro de sintaxe. Arte é sempre sujeito e nós somos o seu predicado.
Paassem-me o Nobel agora.
Paassem-me o Nobel agora.
domingo, 9 de maio de 2010
Uma parada na estrada. O que ficou para trás e o que há adiante.
Vocês sabem que dia é hoje? Não estou falando de dia das mães aqui! Como se elas tivessem importância. Todo mundo sabe, o trabalho do parto é mais do filho de sair do que da mãe de tirá-lo. Francamente, deixemos o puxa-saquismo materno e a propaganda para a televisão. Hoje, 9 de maio de 2010, faz exatamente 3 anos que, com um alguns clicks, esse blog foi criado.
Desde então, muitas pessoas tiveram o prazer de ler os meus contos e me xingarem nos comentários. Muitas dessas pessoas curiosamente desapareceram em cinscunstâncias estranhas e nunca mais foram encontradas. Como a justiça averiguou, e quero frisar bem isso, eu não tenho nada a ver com tais casos infelizes, mas espero que todos aqueles que proferiram algo contra a minha genialidade estejam sofrendo bastante.
Não sou de falar de aniversário de blog, tanto que nos anos anteriores nunca fiz nenhuma menção. Porém, me considero feliz por continuar a escrever por tanto tempo, independente da qualidade dos textos. Na terceira série, época de cavaleiros do zodíaco na manchete e mulheres se esfregando na banheira do Gugu, eu era o sujeito mais apagado da sala de aula. Não havia nada que fizesse me destacar, a não ser a vez que eu levei uma borrachada na cara e fiquei com os lábios comicamente inchados. Infelizmente, a fama durou pouco. Deixei de ser astro, quando o meu rosto virou evidência da baderna que acontecia na sala de aula. De qualquer forma, ser acertado por uma borracha todos os dias não era o tipo de vida que eu queria seguir. Houve, contudo, um acontecimento que me deixou muito mais orgulhoso e que eu poderia mostrar para os meus pais e não para um médico. Uma história minha fora elogiada pela professora de português.
Geralmente, na escola, mandam a gente sempre fazer uma dissertação, segundo as extremamente detalhadas instruções de que uma boa redação tem início, meio e fim. Essas instruções só não são melhores do que as dadas por revistas femininas de como um homem deve ser: inteligente, porém selvagem; tímido, mas meio canalha; ser bom de cama e bom de conversa. É interessante notar que nem as minhas redações era boas nem hoje eu sou um bom homem. A vida... Concentração! Então, naquele ano em particular, a minha professora pediu para os alunos fazerem algo diferente. Não lembro se deu um tema livre ou algo no estilo "como fora as suas férias". Só sei isso: podia ser narrativo, se quisesse. Eu escrevi uma ficção sobre as festas de minha família, principalmente focando nas bebedeiras. O protagonista era, claro, eu; que tinha de me desviar das selvas de garrafas de cerveja. A antagonista: uma paródia de uma tia minha, um tanto neurótica e depressiva. Ela dava entonação a uma coversa banal sobre as condições do tempo, como se fosse um problemão. Dias nublados eram o apocalipse caindo sobre o mundo. Dei-lhe o nome ficcional de Carmemi.
Entreguei a obra-prima e, algumas semanas depois, já estava corrigida. Em frente a todos os alunos, a professora pegou o calhamaço de folhas, com diferentes exemplares de caligrafia, e falou que gostaria de ler em particular a redação de Társio Abranches.
-Társio está? Társio? - chamou ela.
Fodeu. Com certeza, devia ter feito algo errado. Havia ofendido a professora cuja mãe ou outro parente devia se chamar Carmemi. Ou talvez fosse para escrever sobre a violência no Brasil em forma de poesia e não uma ficção. Me encolhi na carteira e recorri ao truque de se esconder atrás das costas de alguém. É, óbvio, isso não funciona muito bem quando várias cabeças se voltam para você. Finalmente, levantei timidamente a mão como se brincasse daquele jogo no qual se entende as palmas para que o outro tente acertá-las com uma bofetada.
A professora deu início a uma breve explicação geral sobre o que tratava a minha história. Patético foi a palavra que percorreu os meus pensamentos. Como podia ter escrito uma babaquice daquelas? Eu seria exemplo para sempre do que não se deve fazer em uma redação. Talvez se dissesse ter copiado a redação de um outro estudante, eu poderia ficar eternizado para sempre como um plagiador. Parecia melhor do que errar naqueles dias. Enquanto eu bolava um esquema, a professora começara a ler em voz alta. Esperava ouvir as vaias, garotos gritando seja lá o que garotos gritavam naqueles tempos. Com certeza algo mais ofensivo do que "orelha de burro e cabeça de ET". Estava errado. Em vez de condenações, ouvi alguns risos de divertimento e o parabéns da minha professora. O primeiro parabéns que eu recebia genuinamente por algo de minha criação. Colegas vieram até falar comigo depois sobre a tia Carmemi, me perguntando de onde eu a havia tirado. Oras, não se explica genialidade, meus caros. Fiquei muito contente comigo mesmo naquela hora. Do mesmo jeito, fico contente ao postar um conto no blog ou ao fim de um roteiro escrito depois de muito enrolar.
Espero manter ainda o Devaneios Inúteis por muito tempo. Existe um mago chamado Rincewind nos livros de Terry Prechett que não consegue fazer uma magia sequer. Ele foi expulso da Univerdade Invisível e mesmo assim corre(ou foge seria a palavra certa) o mundo com um chapéu púido que ostenta a palavra mago escrita. Muita gente duvida dele. E a um deles Rincewind diz: "Dom só define o que se faz. Não define o que se é. No fundo. Quando a gente sabe o que é, pode tudo."
Por mais disfarces que eu tenha de usar para sobreviver nessa vida, quero sempre saber quem sou e ter a força para contar as minhas bobas histórias de uma mente nada brilhante aqui.
Agradeço a todos que leram e comentaram e aos que leram e não comentaram! Muito obrigado.
Desde então, muitas pessoas tiveram o prazer de ler os meus contos e me xingarem nos comentários. Muitas dessas pessoas curiosamente desapareceram em cinscunstâncias estranhas e nunca mais foram encontradas. Como a justiça averiguou, e quero frisar bem isso, eu não tenho nada a ver com tais casos infelizes, mas espero que todos aqueles que proferiram algo contra a minha genialidade estejam sofrendo bastante.
Não sou de falar de aniversário de blog, tanto que nos anos anteriores nunca fiz nenhuma menção. Porém, me considero feliz por continuar a escrever por tanto tempo, independente da qualidade dos textos. Na terceira série, época de cavaleiros do zodíaco na manchete e mulheres se esfregando na banheira do Gugu, eu era o sujeito mais apagado da sala de aula. Não havia nada que fizesse me destacar, a não ser a vez que eu levei uma borrachada na cara e fiquei com os lábios comicamente inchados. Infelizmente, a fama durou pouco. Deixei de ser astro, quando o meu rosto virou evidência da baderna que acontecia na sala de aula. De qualquer forma, ser acertado por uma borracha todos os dias não era o tipo de vida que eu queria seguir. Houve, contudo, um acontecimento que me deixou muito mais orgulhoso e que eu poderia mostrar para os meus pais e não para um médico. Uma história minha fora elogiada pela professora de português.
Geralmente, na escola, mandam a gente sempre fazer uma dissertação, segundo as extremamente detalhadas instruções de que uma boa redação tem início, meio e fim. Essas instruções só não são melhores do que as dadas por revistas femininas de como um homem deve ser: inteligente, porém selvagem; tímido, mas meio canalha; ser bom de cama e bom de conversa. É interessante notar que nem as minhas redações era boas nem hoje eu sou um bom homem. A vida... Concentração! Então, naquele ano em particular, a minha professora pediu para os alunos fazerem algo diferente. Não lembro se deu um tema livre ou algo no estilo "como fora as suas férias". Só sei isso: podia ser narrativo, se quisesse. Eu escrevi uma ficção sobre as festas de minha família, principalmente focando nas bebedeiras. O protagonista era, claro, eu; que tinha de me desviar das selvas de garrafas de cerveja. A antagonista: uma paródia de uma tia minha, um tanto neurótica e depressiva. Ela dava entonação a uma coversa banal sobre as condições do tempo, como se fosse um problemão. Dias nublados eram o apocalipse caindo sobre o mundo. Dei-lhe o nome ficcional de Carmemi.
Entreguei a obra-prima e, algumas semanas depois, já estava corrigida. Em frente a todos os alunos, a professora pegou o calhamaço de folhas, com diferentes exemplares de caligrafia, e falou que gostaria de ler em particular a redação de Társio Abranches.
-Társio está? Társio? - chamou ela.
Fodeu. Com certeza, devia ter feito algo errado. Havia ofendido a professora cuja mãe ou outro parente devia se chamar Carmemi. Ou talvez fosse para escrever sobre a violência no Brasil em forma de poesia e não uma ficção. Me encolhi na carteira e recorri ao truque de se esconder atrás das costas de alguém. É, óbvio, isso não funciona muito bem quando várias cabeças se voltam para você. Finalmente, levantei timidamente a mão como se brincasse daquele jogo no qual se entende as palmas para que o outro tente acertá-las com uma bofetada.
A professora deu início a uma breve explicação geral sobre o que tratava a minha história. Patético foi a palavra que percorreu os meus pensamentos. Como podia ter escrito uma babaquice daquelas? Eu seria exemplo para sempre do que não se deve fazer em uma redação. Talvez se dissesse ter copiado a redação de um outro estudante, eu poderia ficar eternizado para sempre como um plagiador. Parecia melhor do que errar naqueles dias. Enquanto eu bolava um esquema, a professora começara a ler em voz alta. Esperava ouvir as vaias, garotos gritando seja lá o que garotos gritavam naqueles tempos. Com certeza algo mais ofensivo do que "orelha de burro e cabeça de ET". Estava errado. Em vez de condenações, ouvi alguns risos de divertimento e o parabéns da minha professora. O primeiro parabéns que eu recebia genuinamente por algo de minha criação. Colegas vieram até falar comigo depois sobre a tia Carmemi, me perguntando de onde eu a havia tirado. Oras, não se explica genialidade, meus caros. Fiquei muito contente comigo mesmo naquela hora. Do mesmo jeito, fico contente ao postar um conto no blog ou ao fim de um roteiro escrito depois de muito enrolar.
Espero manter ainda o Devaneios Inúteis por muito tempo. Existe um mago chamado Rincewind nos livros de Terry Prechett que não consegue fazer uma magia sequer. Ele foi expulso da Univerdade Invisível e mesmo assim corre(ou foge seria a palavra certa) o mundo com um chapéu púido que ostenta a palavra mago escrita. Muita gente duvida dele. E a um deles Rincewind diz: "Dom só define o que se faz. Não define o que se é. No fundo. Quando a gente sabe o que é, pode tudo."
Por mais disfarces que eu tenha de usar para sobreviver nessa vida, quero sempre saber quem sou e ter a força para contar as minhas bobas histórias de uma mente nada brilhante aqui.
Agradeço a todos que leram e comentaram e aos que leram e não comentaram! Muito obrigado.
quinta-feira, 6 de maio de 2010
Esconde-Esconde
Você deita. A cabeça encosta no travesseiro. Os olhos se fecham na tentativa de esconder o mundo. Mas o mundo está lá. Você pode ouvir o barulho, os sons de pessoas apressadas, do ranger dos músculos da face de seus pais quando nervosos pensam sobre seu futuro, a terra trilhando a rota em torno do Sol, os dias passando. Você abre os olhos. É barulho demais martelando dentro dos seus ouvidos. Olha para tudo em volta, preso. Procura alguma solução, uma passagem secreta. Você devia ser engenhoso. Devia ser inteligente. Se não for, outros serão e você ficará preso. O desespero o deixa inerte. Estão te ultrapassando. É o que pensa. Você é só mais um desses sonhadores. Uma criança. Por que não é mais responsável? Por que não segura o volante da sua vida? Você deita. A cabeça encosta no travesseiro. Os olhos se fecham na tentativa de esconder o mundo.
segunda-feira, 3 de maio de 2010
Onde tudo termina (ou vá ao show do Mundo Inferior dia 7)
Após descer 10, 12, sei lá tantos círculos do inferno
Dante chega diante de uma porta e um diabo de terno
que lhe pergunta
-Posso ver seu ingresso?
-Mas como assim?!
-Estou lhe dizendo, não fique possesso, mas para entrar aqui terá que ter mais do que rimas, sim.
-Que despropério! Pois já lhe dei uma alma que vale mais que um império?!
-Exagero de sua parte. Poesia ruim não dá nem pro embate.
Quando ia reclamar e um verso declamar
Surge Fausto, no seu encalço
Aperta a mão do demônio sorridente e adentra garboso o recinto.
Irritado Dante levanta a calça e seu cinto
E mostra ao demonio os trincados dentes.
-Pois Fausto não precisa de ingresso?
-É amigo de Mefistófeles, patrão perverso.
-Que situação mais ingrata!
-Vá-se embora para Passárgada
-Como?
-Hã... Omo?
O demônio encara Dante
Dante encara o demônio
Será esse o fim de suas aventuras
Dar meia volta e procurar sua turma?
Foi aí que teve uma idéia
-Estudioso que sou, possou lhe servir de advogado.
Depois de ouvir toda a epopéia,
O chifrudo aceitou, depois de se fazer de rogado.
Foi assim que surgiu o advogado do diabo
***
A porta se abriu e a sombra caiu
O ar abafado pelo murmurinho agitado
Até onde será lhe teria levado o seu fado?
Mas luzes se fizeram, coloridas
Iluminando os rostos e formas fantásticas
E Dante pensou "acho que eles precisam de plásticas"
Então soaram do inferno as trombetas.
Fecharam-se bocas, presas e sugadores
Era hora de todos os pecadores
Esquecerem suas vendetas
para ouvir "Agradecemos sua presença: monstros, senhoras e senhores!
Escutem e sejam bem vindos ao Mundo Inferior!"
Guitarra para balançar as garras
Trompete para matar o cara na frente de topete
Bateria para uma batida a ser acompanhada com difteria
Baixo para pôr fim ao hiato
Entre a vida e o pós-morte
Dante havia encontrado um show no fim, que sorte.
Dante chega diante de uma porta e um diabo de terno
que lhe pergunta
-Posso ver seu ingresso?
-Mas como assim?!
-Estou lhe dizendo, não fique possesso, mas para entrar aqui terá que ter mais do que rimas, sim.
-Que despropério! Pois já lhe dei uma alma que vale mais que um império?!
-Exagero de sua parte. Poesia ruim não dá nem pro embate.
Quando ia reclamar e um verso declamar
Surge Fausto, no seu encalço
Aperta a mão do demônio sorridente e adentra garboso o recinto.
Irritado Dante levanta a calça e seu cinto
E mostra ao demonio os trincados dentes.
-Pois Fausto não precisa de ingresso?
-É amigo de Mefistófeles, patrão perverso.
-Que situação mais ingrata!
-Vá-se embora para Passárgada
-Como?
-Hã... Omo?
O demônio encara Dante
Dante encara o demônio
Será esse o fim de suas aventuras
Dar meia volta e procurar sua turma?
Foi aí que teve uma idéia
-Estudioso que sou, possou lhe servir de advogado.
Depois de ouvir toda a epopéia,
O chifrudo aceitou, depois de se fazer de rogado.
Foi assim que surgiu o advogado do diabo
***
A porta se abriu e a sombra caiu
O ar abafado pelo murmurinho agitado
Até onde será lhe teria levado o seu fado?
Mas luzes se fizeram, coloridas
Iluminando os rostos e formas fantásticas
E Dante pensou "acho que eles precisam de plásticas"
Então soaram do inferno as trombetas.
Fecharam-se bocas, presas e sugadores
Era hora de todos os pecadores
Esquecerem suas vendetas
para ouvir "Agradecemos sua presença: monstros, senhoras e senhores!
Escutem e sejam bem vindos ao Mundo Inferior!"
Guitarra para balançar as garras
Trompete para matar o cara na frente de topete
Bateria para uma batida a ser acompanhada com difteria
Baixo para pôr fim ao hiato
Entre a vida e o pós-morte
Dante havia encontrado um show no fim, que sorte.
sexta-feira, 23 de abril de 2010
A velha piada imoral de Gotham
Nas trevas de Gotham City, homens e mulheres tiravam suas máscaras e se mostravam os monstros que eram.Em algum beco, pessoas eram assassinadas, mafiosos passavam propinas a políticos e menores de idade se prostituíam. Era o único beco escuro da região, por incrível que pareça.
Mas nada disso realmente preocupava Batman. Do alto do maior edifício, com a sua capa esvoaçando como se estivesse viva, o único problema que ocupava a sua cabeça era Robin. Completando: o seu amor por Robin. Havia anos tentava lutar contra aquele desejo que o comia por dentro. Desde que o vira pela primeira vez, sua vontade era abraçar aquele pequeno órfão de corpo tão... elástico. Mas como agüentar as piadas, a humilhação, o preconceito?! Era o super-herói mais macho do universo, tinha uma reputação a manter. Claro, devia confessar que o uniforme de sunguinha e pernocas pra fora havia sido idéia dele, mas fora só um pequeno capricho. Mas aquilo já havia ido longe demais. Queria cantar o seu amor para o Robin para todo mundo ouvir e que se dane-se o que os outros heróis pensassem! Assim que Robin chegasse, iria dizer que o amava e ia fazer coisas que até...
-Fala aí, seu puto!
Batman virou para ver o menino-prodígio, à luz da lua um deus grego. Por um momento deixou as sobrancelhas levantarem e o queixo cair, mas logo recuperou a sua cara de puto.
-Eer... hum e aí, Robin, como vai? Ta mais forte hein?
-Ando malhando! Sabe como é, hoje em dia não é tão fácil espancar vilão. Todo mundo vem com alguma porra de anel colorido.
-É., pô, deixa eu dar uma apertada pra ver se tá forte mesmo.-disse Batman já levantando as mãos.
-Depois. Mas então, Batman, qual é a parada? Coringa escapou de Arkham de novo?
As bochechas de Batman ficaram vermelhas, obrigando-o a dar meia volta para escondê-las. Era a hora.
-Bem... Robin. Nós já nos conhecemos há muito tempo né?
-Ah, desde mó tempão, chefe. Eu nem me lembro mais direito.
-Robin, quando eu te conheci você era um menino, um jovem com muito potencial e... hã agora você é um homem crescido e forte e .... o que estou tentando dizer, Robin, é que eu...
-Ah já sei!
Com o coração querendo sair pela cabeça, Batman se voltou súbito para Robin. Esse ostentava um sorriso maroto no rosto.
-Já sabe?!
-Sim! Sei.
-Bem e você tem algum... algum problema com isso?
-Não, é tranqüilo.
-Ah que bom,talvez a gente possa sair pra tomar alguma bebida...
-Eu e a Batgirl já resolvemos esse problema.
-ou podemos ir pra casa. Tem uns cds legais da Kate Perry... Opa, opa, opa! Que a Batgirl tem a ver com isso?
-Ah bem, nós trepamos. Não precise se preocupar com a conversa sobre a abelhinha macho e a fêmea ou qualquer coisa assim...
-Vocês o que?!
-Que foi seu, puto? Tava pegando ela? Hehe
-Arghhh.
Num sopro, Batman saltou do prédio e caiu na escuridão de Gotham.
2 horas depois Batman estava quebrando a espinha de Bárbara Gordon, enchendo os pacientes do Asilo Arkham de porrada e assistindo vídeo pornô gay na internet.
Mas nada disso realmente preocupava Batman. Do alto do maior edifício, com a sua capa esvoaçando como se estivesse viva, o único problema que ocupava a sua cabeça era Robin. Completando: o seu amor por Robin. Havia anos tentava lutar contra aquele desejo que o comia por dentro. Desde que o vira pela primeira vez, sua vontade era abraçar aquele pequeno órfão de corpo tão... elástico. Mas como agüentar as piadas, a humilhação, o preconceito?! Era o super-herói mais macho do universo, tinha uma reputação a manter. Claro, devia confessar que o uniforme de sunguinha e pernocas pra fora havia sido idéia dele, mas fora só um pequeno capricho. Mas aquilo já havia ido longe demais. Queria cantar o seu amor para o Robin para todo mundo ouvir e que se dane-se o que os outros heróis pensassem! Assim que Robin chegasse, iria dizer que o amava e ia fazer coisas que até...
-Fala aí, seu puto!
Batman virou para ver o menino-prodígio, à luz da lua um deus grego. Por um momento deixou as sobrancelhas levantarem e o queixo cair, mas logo recuperou a sua cara de puto.
-Eer... hum e aí, Robin, como vai? Ta mais forte hein?
-Ando malhando! Sabe como é, hoje em dia não é tão fácil espancar vilão. Todo mundo vem com alguma porra de anel colorido.
-É., pô, deixa eu dar uma apertada pra ver se tá forte mesmo.-disse Batman já levantando as mãos.
-Depois. Mas então, Batman, qual é a parada? Coringa escapou de Arkham de novo?
As bochechas de Batman ficaram vermelhas, obrigando-o a dar meia volta para escondê-las. Era a hora.
-Bem... Robin. Nós já nos conhecemos há muito tempo né?
-Ah, desde mó tempão, chefe. Eu nem me lembro mais direito.
-Robin, quando eu te conheci você era um menino, um jovem com muito potencial e... hã agora você é um homem crescido e forte e .... o que estou tentando dizer, Robin, é que eu...
-Ah já sei!
Com o coração querendo sair pela cabeça, Batman se voltou súbito para Robin. Esse ostentava um sorriso maroto no rosto.
-Já sabe?!
-Sim! Sei.
-Bem e você tem algum... algum problema com isso?
-Não, é tranqüilo.
-Ah que bom,talvez a gente possa sair pra tomar alguma bebida...
-Eu e a Batgirl já resolvemos esse problema.
-ou podemos ir pra casa. Tem uns cds legais da Kate Perry... Opa, opa, opa! Que a Batgirl tem a ver com isso?
-Ah bem, nós trepamos. Não precise se preocupar com a conversa sobre a abelhinha macho e a fêmea ou qualquer coisa assim...
-Vocês o que?!
-Que foi seu, puto? Tava pegando ela? Hehe
-Arghhh.
Num sopro, Batman saltou do prédio e caiu na escuridão de Gotham.
2 horas depois Batman estava quebrando a espinha de Bárbara Gordon, enchendo os pacientes do Asilo Arkham de porrada e assistindo vídeo pornô gay na internet.
quinta-feira, 22 de abril de 2010
Enquanto se beijavam, no ponto de ônibus, debaixo da luz amarelada do poste público, destacando os dois da noite da cidade; ela não pensava que o trabalho na loja era uma merda, nem que não sabia o que fazer com vida. Pensava apenas no instante , nele, no cara por quem ela procurava.
Enquanto se beijavam, no ponto de ônibus, com pessoas estranhas em volta, o barulho de ônibus roncando nas ruas perdidas no escuro pela exceção da luz de um poste; ele pensava que ela podia parecer, mas não era aquela que perdera.
Enquanto se beijavam, no ponto de ônibus, com pessoas estranhas em volta, o barulho de ônibus roncando nas ruas perdidas no escuro pela exceção da luz de um poste; ele pensava que ela podia parecer, mas não era aquela que perdera.
domingo, 11 de abril de 2010
Next level
Joe enfrentava um ogro que soltava fogo pela boca. Para vencê-lo, era necessário além de desviar das bolas de fogo mortais, pular para cima de uma plataforma móvel, conseguir pegar algumas das pedras que caiam inexplicavelmente do céu e as tacar na cabeça do ogro. Isso fazia parte do dia-a-dia de Joe. Isso e pular sobre buracos, brigar com pessoas desconhecidas, coletar moedas e salvar princesas. Joe jogou uma pedra especialmente grande no monstro e terminou o serviço. Suspirou aliviado, enquanto moedas se espalhavam onde antes havia um cadáver. Você deve achar que Joe adora a adrenalina de uma vida arriscada, mas não. Ele odiava tudo aquilo. As vezes ele queria só ficar ali, parado, curtindo a paisagem ou voltar para casa e para sua família. O problema é que parecia haver uma força o atraindo para aventuras. Uma hora estava comendo café da manhã, lendo o jornal. Outra, estava enfrentando um gorila biônico, com uma espada sagrada na mão direita e uma princesa gorda na mão esquerda falando em como o reino dela o recompensaria. Bem, geralmente o reino dela estava muito feliz que ela estivesse com um monstro, em vez de na cidade gastando o dinheiro dos impostos com pôneis e chás de cogumelo.
Era hora de dar um basta naquilo! Recuperar o controle. Joe decidiu que não faria nada dessa vez. Sentou-se e ignorou os comandos na sua cabeça que o mandavam seguir em frente e pegar moedas. Ignorou, com muito esforço, até os pensamentos de pular em cima de uma criatura indefesa que passeava tranquilamente pelo gramado. Trincou os dentes e suou quando um coração valendo uma vida extra apareceu na sua frente. Tentou se concentrar no fato de que uma vida já dava trabalho demais.
O que se provou mais do que certo ao ver um pterodátilo de duas cabeças aterrissar na sua frente. Uma das suas cabeças segurava uma princesa em suas mandíbulas. Joe olhou para o outro lado, fingindo não o ver.
-Hey você.-chamou o pterodátilo
-quem, onde?
-Aqui ó. Capturei a princesa.
-Socorro- disse a princesa – Me ajude! Estou 2 dias sem passar creme e a minha pele está ressecando.
-E daí, que que vocês querem?- resmungou Joe.
O pterodatilo não era muito bom para pensar em coisas, senão estaria em outro trabalho. A única resposta boa que lhe veio a mente foi:
-Bem, sabe como é... eu capturei a princesa.
-Que bom para você.
-Então vamos brigar até a morte? Só não me segure pelo rabo está bem. É o meu ponto fraco.
-Lamento, ninguém vai segurar o rabo de ninguém.
-Que!-exclamou o pterodátilo
-Que!-exclamou a princesa.
Joe mudou de posição para não encarar os dois. E sorriu para a liberdade de fazer nada.
Sentado no chão do quarto, os dedos apertando todos os botões coloridos e girando todos os direcionais do controle, Luis não entendia o porquê de seu boneco não estar fazendo simplesmente nada. Era como se ver no espelho. E o jogo era novo e parecia rodar normalmente, fora o seu boneco, sentado ali, prestes a tirar um cochilo.
-Se mexe, caralho?-clamou em desespero.
-Não, obrigado.-falou Joe, do ecran da televisão.
-Peraí, você fala?
-Quando eu não estou matando algum monstro, sim. Também sei cantar muito bem. Gostaria de ouvir “hey Jude.”?
-EU... por que você não está me obedecendo?
-Na na na na nananaaaaaaaaaaa! Nanananaaa Hey Jude!
-Peraí!
-Olha, eu não obedeço a ninguém ta legal. Se você quer viver aventuras, vai fundo! Eu quero aproveitar o ótimo dia que faz hoje.
-Ai aii! Mas jogar vídeo game é tudo o que eu faço. E a gente já tava zerando o jogo.
-Bem, eu já vi o final algumas vezes. Não é muito recompensador. Só te dão os parabéns e entra uma tela preta.
Luis deixou o controle cair de suas mãos frouxas. Estava vencido pelo próprio personagem. Sentiu-se reduzido a menos dimensões do que um jogo de 8 bits e ficou todo encolhido em sua cadeira. Teria que começar a sair de casa agora e talvez até falar com as garotas. Que fim cruel!
-Hey, jude, don’t make it bad –cantou Joe, tentando animá-lo. Luis permaneceu em silêncio. Joe continuou. -Take a sad song and make it better…
-remember to let her into your heart…- soou baixinho a voz sem ritmo e esganiçada de Luis.
-Then you start...
-and make it better.- completou Luis
E juntos eles cantaram: NA na NA NANANANAAAAAA na nA nAAAA Hey jude!
Era hora de dar um basta naquilo! Recuperar o controle. Joe decidiu que não faria nada dessa vez. Sentou-se e ignorou os comandos na sua cabeça que o mandavam seguir em frente e pegar moedas. Ignorou, com muito esforço, até os pensamentos de pular em cima de uma criatura indefesa que passeava tranquilamente pelo gramado. Trincou os dentes e suou quando um coração valendo uma vida extra apareceu na sua frente. Tentou se concentrar no fato de que uma vida já dava trabalho demais.
O que se provou mais do que certo ao ver um pterodátilo de duas cabeças aterrissar na sua frente. Uma das suas cabeças segurava uma princesa em suas mandíbulas. Joe olhou para o outro lado, fingindo não o ver.
-Hey você.-chamou o pterodátilo
-quem, onde?
-Aqui ó. Capturei a princesa.
-Socorro- disse a princesa – Me ajude! Estou 2 dias sem passar creme e a minha pele está ressecando.
-E daí, que que vocês querem?- resmungou Joe.
O pterodatilo não era muito bom para pensar em coisas, senão estaria em outro trabalho. A única resposta boa que lhe veio a mente foi:
-Bem, sabe como é... eu capturei a princesa.
-Que bom para você.
-Então vamos brigar até a morte? Só não me segure pelo rabo está bem. É o meu ponto fraco.
-Lamento, ninguém vai segurar o rabo de ninguém.
-Que!-exclamou o pterodátilo
-Que!-exclamou a princesa.
Joe mudou de posição para não encarar os dois. E sorriu para a liberdade de fazer nada.
Sentado no chão do quarto, os dedos apertando todos os botões coloridos e girando todos os direcionais do controle, Luis não entendia o porquê de seu boneco não estar fazendo simplesmente nada. Era como se ver no espelho. E o jogo era novo e parecia rodar normalmente, fora o seu boneco, sentado ali, prestes a tirar um cochilo.
-Se mexe, caralho?-clamou em desespero.
-Não, obrigado.-falou Joe, do ecran da televisão.
-Peraí, você fala?
-Quando eu não estou matando algum monstro, sim. Também sei cantar muito bem. Gostaria de ouvir “hey Jude.”?
-EU... por que você não está me obedecendo?
-Na na na na nananaaaaaaaaaaa! Nanananaaa Hey Jude!
-Peraí!
-Olha, eu não obedeço a ninguém ta legal. Se você quer viver aventuras, vai fundo! Eu quero aproveitar o ótimo dia que faz hoje.
-Ai aii! Mas jogar vídeo game é tudo o que eu faço. E a gente já tava zerando o jogo.
-Bem, eu já vi o final algumas vezes. Não é muito recompensador. Só te dão os parabéns e entra uma tela preta.
Luis deixou o controle cair de suas mãos frouxas. Estava vencido pelo próprio personagem. Sentiu-se reduzido a menos dimensões do que um jogo de 8 bits e ficou todo encolhido em sua cadeira. Teria que começar a sair de casa agora e talvez até falar com as garotas. Que fim cruel!
-Hey, jude, don’t make it bad –cantou Joe, tentando animá-lo. Luis permaneceu em silêncio. Joe continuou. -Take a sad song and make it better…
-remember to let her into your heart…- soou baixinho a voz sem ritmo e esganiçada de Luis.
-Then you start...
-and make it better.- completou Luis
E juntos eles cantaram: NA na NA NANANANAAAAAA na nA nAAAA Hey jude!
terça-feira, 6 de abril de 2010
sexta-feira, 2 de abril de 2010
Geração rebelde
-Te odeio te odeio te odeiÔ!
Lis queria ter atitude Rock’n’Roll e para tanto precisava de uma guitarra Tajima, R$ 1.000,00; um conjunto de roupas da loja Punk Stytlos por R$300,00; um acidente geográfico na cabeça feito com uma tesoura enferrujada por R$400; R$ 2.000 de piercing no umbigo, ouvido, boca e –ainda não decidira – nos mamilos ou na vagina ; e – esse detalhe guardou para si- sexo com caras que tomam drogas injetáveis.
A mãe, que era mais um peão nas mãos do sistema, disse não.
Lis queria ter atitude Rock’n’Roll e para tanto precisava de uma guitarra Tajima, R$ 1.000,00; um conjunto de roupas da loja Punk Stytlos por R$300,00; um acidente geográfico na cabeça feito com uma tesoura enferrujada por R$400; R$ 2.000 de piercing no umbigo, ouvido, boca e –ainda não decidira – nos mamilos ou na vagina ; e – esse detalhe guardou para si- sexo com caras que tomam drogas injetáveis.
A mãe, que era mais um peão nas mãos do sistema, disse não.
terça-feira, 30 de março de 2010
Da série perfis de um assassino!
Jason e uma jornalista estão sentados a mesa, dentro do sítio-acampamento da família de Jason.
-Jason, é verdade que você está processando a família das vítimas que você assassinou brutalmente?
-Exatamente, Clarecy. Todos eles.
-Você pode falar mais sobre o assunto. Alguns acham que você não tem esse direito.
-Como não?! Clarecy, deixe eu contar uma coisa, a sua família constrói um belo acampamento, uma verdadeira reserva da natureza que você tenta manter durante a vida inteira. Daí, chegam alguns adolescentes, vindos Deus sabe lá daonde, eles estacionam os seus carros no lugar e entram, como se fossem os donos da terra. Eles usam seu banheiro, atacam animais, fazem fogueiras, tomam drogas (sim, os filhos de vocês são uns drogados!) e ficam fazendo.. bem.. sabe... aquelas coisas...
-Como?
-Você sabe.
-Acho que não. Festejar? Cantar?Assaltar?
-Não não. Eles... bem, eles... fazem... é, sexo... o o que é muito errado! Ninguém me vê fazendo uma coisa dessas!
-É?
-Quer dizer, não por falta de convite. O que não faltam é mulheres interessadas em mim.
-Sim, claro.
-Só acho errado! Hum.. como estava dizendo, eles bagunçam o lugar inteiro e você acha que eles pagam alguma coisa?
-Bem, deveriam.
-Pois não pagam! Nem compram o seu artesanato! É ou não é para ficar irado?!
-É um absurdo realmente.
-Aliás, se quiserem ver o meu artesanato depois. Tem umas pedras pintadas que são lindas e tem também uns colares que eu fiz com...
-Mas, Jason, será que os assassinatos não foi uma atitude meio excedida.
-Olha, eu fiz o que fiz para defender a minha propriedade, legítima defesa! Qualquer bom americano faria o mesmo. No início, eu só tentava assustar. Ligava uma serra, mas você vê se paravam? Todo ano vem mais adolescente!
-E o que você tem a dizer sobre a família em que você mata todas as descendentes mulheres? Eles disseram que você apareceu no meio de uma formatura para matar uma delas e que deixou cair a cabeça decepada no ponche.
-É, eu não vou com a cara delas, mas lamento pelo ponche.
-Últimas palavras?
-Eu sou só um homem com uma máscara de hockey quer quer cuidar da sua terra sem perturbado. Pago os meus impostos e quero que tirem os nossos meninos do Iraque. Sou um homem igual a qualquer outro.
-Encerramos aqui a nossa entrevista...
-Hey, você se esqueceu de mostrar os meus artesanatos...
-...Você viu o homem por trás da máscara de hockey...
-Você esqueceu...
-Será ele culpado? Não perca o julgamento aqui, na CBN news.
-Jason, é verdade que você está processando a família das vítimas que você assassinou brutalmente?
-Exatamente, Clarecy. Todos eles.
-Você pode falar mais sobre o assunto. Alguns acham que você não tem esse direito.
-Como não?! Clarecy, deixe eu contar uma coisa, a sua família constrói um belo acampamento, uma verdadeira reserva da natureza que você tenta manter durante a vida inteira. Daí, chegam alguns adolescentes, vindos Deus sabe lá daonde, eles estacionam os seus carros no lugar e entram, como se fossem os donos da terra. Eles usam seu banheiro, atacam animais, fazem fogueiras, tomam drogas (sim, os filhos de vocês são uns drogados!) e ficam fazendo.. bem.. sabe... aquelas coisas...
-Como?
-Você sabe.
-Acho que não. Festejar? Cantar?Assaltar?
-Não não. Eles... bem, eles... fazem... é, sexo... o o que é muito errado! Ninguém me vê fazendo uma coisa dessas!
-É?
-Quer dizer, não por falta de convite. O que não faltam é mulheres interessadas em mim.
-Sim, claro.
-Só acho errado! Hum.. como estava dizendo, eles bagunçam o lugar inteiro e você acha que eles pagam alguma coisa?
-Bem, deveriam.
-Pois não pagam! Nem compram o seu artesanato! É ou não é para ficar irado?!
-É um absurdo realmente.
-Aliás, se quiserem ver o meu artesanato depois. Tem umas pedras pintadas que são lindas e tem também uns colares que eu fiz com...
-Mas, Jason, será que os assassinatos não foi uma atitude meio excedida.
-Olha, eu fiz o que fiz para defender a minha propriedade, legítima defesa! Qualquer bom americano faria o mesmo. No início, eu só tentava assustar. Ligava uma serra, mas você vê se paravam? Todo ano vem mais adolescente!
-E o que você tem a dizer sobre a família em que você mata todas as descendentes mulheres? Eles disseram que você apareceu no meio de uma formatura para matar uma delas e que deixou cair a cabeça decepada no ponche.
-É, eu não vou com a cara delas, mas lamento pelo ponche.
-Últimas palavras?
-Eu sou só um homem com uma máscara de hockey quer quer cuidar da sua terra sem perturbado. Pago os meus impostos e quero que tirem os nossos meninos do Iraque. Sou um homem igual a qualquer outro.
-Encerramos aqui a nossa entrevista...
-Hey, você se esqueceu de mostrar os meus artesanatos...
-...Você viu o homem por trás da máscara de hockey...
-Você esqueceu...
-Será ele culpado? Não perca o julgamento aqui, na CBN news.
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