sexta-feira, 27 de junho de 2014

Avulsos III

É difícil encontrar um par de pernas que combine com o par dos meus braços e nunca encontro um corpo que se ajuste ao meu esqueleto. Sempre um número a mais ou um número a menos.
Juro que se a minha alma não fosse tão suja sairia na rua sem corpo.
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Acontece de você estar se sentindo terrivelmente só e o telefone toca, e em vez de se sentir tremendamente aliviado você fica aborrecido porque estão atrapalhando a sua solidão?
O ser humano, gente...
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Algumas pessoas mentem para si mesmas, e são felizes. Outras mentem para si mesmas mas percebem, e não são felizes.
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Olhei o meu reflexo no lago. Mas vi o rosto do tio Carlinhos. Fiquei atônito por um momento. Até que percebi que era só o corpo sem vida dele dele que tinha emergido. Ainda bem.
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Vou guardando cada irritação em potinhos reaproveitados de maionese, requeijão, geleia e de outros produtos que a gente usa para esconder o sabor ruim das coisas. Tenho potinhos em todo canto: no chão, nas estantes, debaixo da cama, no armário do banheiro, no escritório, no tanque... Já é difícil encontrar lugar para pôr os pés e posso a qualquer momento quebrar algum dos potes e deixar escapar irritação por aí. Talvez se pudesse guardar na casa de alguém, ou se adotassem irritação dos outros... Melhor seria mesmo poder lançar todos os potinhos ao espaço sideral. Minha irritação ficaria em órbita. E se mais fizessem o mesmo, teríamos anéis de xingamentos, gritos, esporros e histerias rodando ao redor da Terra. Quem quer que quisesse sair ou entrar no nosso planeta ouviria poucas e boas.

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