quinta-feira, 15 de março de 2012

Ah, o ar puro! Ah, as flores! Ah, o cheiro de sangue...

Pois no final de semana viajei pra Miguel Pereira, com família -- e também segundo minha avó com Deus, mas ele não coube no carro e teve que ir de ônibus. Pra quem não sabe, Miguel Pereira é uma cidade de serra, pra depois de Queimados. Dessas que, pra chegar, você percorre inclinadas estradas estreitas em meio a muito mato e visões de uma provável morte despencando de uma das encostas. Mas se você superar o medo, é até bonito.

É muita paz, muito ar puro, muito passarinho cantando, e o lugar tem essa qualidade das cidadezinhas de amansar o tempo, torná-lo mais lento, as horas se espreguiçam por lá e toda gente anda com uma tranquilidade de quem nunca aprendeu que tempo é dinheiro. Uma paz sem igual, porém uma paz feita talvez com segredos, sangue e sumiços.

Em uma conversa com uma funcionária da pousada em que estávamos hospedados, ela disse que lá era um lugar de muita sossego e que qualquer "vagabundo" que desse as caras por lá logo sumia. E ela ainda fez um gesto agitando a mão como se passasse alguém na faca.

"Teve também o caso de duas velhinhas molambentas que ficavam mendigando na rua", ela disse, continuando a falar para um grupo de hóspedes que olhava desconfiado para os lados; bem, pelo menos eu estava. "Elas tinham uma casa bem ruim, caindo aos pedaços. Um dia ninguém mais a viu. Esperaram um tempo para ver se apareciam, mas o tempou passou e foram fazer uma busca na casa dela. Encontraram as duas mortas lá dentro, junto do maior luxo e de um monte de armas. A fachada desabando era só para enganar. As duas eram ricas e trabalhavam pro tráfico de drogas."

E ela continuou a falar sobre a paz citando todos os casos de violência como isolados e que não eram motivos de preocupação pois logo desapareciam, seja porque a "polícia por meios legais ou não" lidava com o problema ou porque a própria população dava cabo, como o caso de um estuprador que foi espancado pela população e sabe-se lá como ele terminou.

É engraçado como as pessoas tem essa visão de paz acima de tudo. Qualquer meio serve para chegar ao sossego, ninguém nunca pensa que dando essa abertura para a polícia agir acima da lei, isso pode voltar-se contra a população. Deixe-os matar, deixe as pessoas desaparecerem, vamos varrendo tudo para debaixo do tapete, até o tapete já não conseguir mais cobrir a sujeira e as pessoas tropeçarem nos calos formados pelo entulho.

"É muita paz aqui", terminou dizendo nossa simpática hospedeira.

2 comentários:

Julia Guará disse...

hahaha, uiui, adorei toda essa ironia, aiai

Társio disse...

Obrigado, Julinha! :)