domingo, 29 de janeiro de 2012

As escolhas que fazemos

Somos frutos das nossas escolhas? Ou frutos do acaso? Ou ainda, frutos de uma cadeia pré-programada? Se for o caso do terceiro, não podemos comprovar, seria impossível perceber a nossa programação, então vamos ignorá-la por enquanto, porque até mesmo ao ignorá-la estaremos fazendo o que a nossa programação quer. Fiquemos com as duas primeiras perguntas, é possível controlar o mundo ou somos controlados por ele? Em outras palavras, a sua vida é uma merda por causa das suas decisões, ou de uma série de fatores além da sua vontade?

Acredito que, na verdade, são duas explicações não excludentes, fazemos escolhas, mas digamos que não escolhemos “essas escolhas”. Você não pode controlar a vida, coisas acontecem independente do que queira. Porém, uma vez que acontecem, você pode fazer uma escolha. Se você nasce pobre é muito pouco provável que você tenha direito a uma boa educação, a ser ator de novela e sair na rua sem ser vítima de preconceito. Mas você pode escolher entre as melhores escolas públicas que há por perto e de repente há cotas que podem te ajudar em escolas particulares e em faculdades públicas (apesar de muitos acharem isso horrível, “dar mais escolhas a uma pessoa? que ideia! ele sabe se virar sem faculdade”). Você pode fazer escolhas íntegras, você pode até usar camisinha para poder desfrutar de um bom sexo sem transtornos futuros (sério, camisinha funciona muito melhor do que tomar banho depois do sexo, já testei!) Ou pode ter filho, é seu direito, cara, não fica puto comigo. Só saiba o que está fazendo.

Da mesma forma, a nossa sociedade não é algo natural, suas mazelas e benefícios são resultados das escolhas de seus integrantes em determinadas situações que acontecem além de qualquer controle. O ser humano não é natural, não completamente. Nós questionamos o natural, e precisamos de um sentido, seja de fato encontrando um ou criando um. Nossa sociedade não é natural e precisamos questioná-la.

Ouvimos agora um monte de jornalistas e políticos esbravejando sobre uma droga chamada crack, subproduto da cocaína. Falam eles, “É preciso acabar com essa doença chamada crack” “Que triste decadência é o crack” Se eu for eleito, acabarei com o crack” “Como alguém pode tomar crack? É nojento.Essa pessoa está perdida, são zumbis”.

Esses nossos queridos amigos tão preocupados falam como se esta fosse uma situação nova, fruto desses loucos tempos modernos, algo nunca visto. A questão não é tratada como o processo de uma exclusão que ocorre desde que algum português gritou Terra à vista! em algum ponto do Atlântico. O crack não é uma droga nova, pessoas que vivem completamente à margem não é um fato novo. E por que o crack é tão mais preocupante que as outras drogas? Parece até que o consumidor de crack não tem aquele requinte de quem toma pedra comprada em pacotinho de veludo com traficante cheio de cultura (e isso sem tocar em antidepressivos e outros drogas aprovados por lei).

O que existe é exclusão, e não há nada pior do que exclusão.

Todos sabem, todos já sentiram como é ser excluído.

No colégio é sempre assim, não é? De repente alguém age de uma forma diferente e passa a ser excluído. Param de falar com essa pessoa. O distanciamento a torna mais desagradável, falam mal dela. Outros de fora do grupo, ao ver o colega sendo excluído, automaticamente concluem que algo ele deve ter de errado e passam a excluí-lo também. O excluído por sua vez, com mágoa, sofrendo com as dores de não poder participar da vida social de sua sala, passa em autodefesa a se excluir também, “eles são idiotas”ou “eu sou um merda, melhor ficar longe, não quero me foder”. A exclusão é alimentada sistematicamente e passa a ser aceita.

Podem se lembrar da sua infância e adolescência e vão perceber que já foram excluídos e também já excluíram. Não me venham com papo de pobre coitado, de nerds e valentões. Em geral, todo mundo experimenta os dois lados, a diferença: alguns são mais “bem-sucedidos” num lado do que no outro. Agora, lembre-se do quanto era ruim. Lembre-se da sensação de querer falar com alguém, mas ter vergonha pois estaria falando com alguém excluído. Lembre-se como era horrível ver a vida acontecer e não fazer parte. Lembre-se como era horrível excluir alguém e de repente perceber o quão mal a pessoa se sentia, e como isso te fez se sentir um monstro.

Pois bem, acontece até hoje.

Vivemos isso todo dia. Dentro da própria sociedade há regras que dependem da exclusão. Nós temos que fazer de tudo para ir para o melhor colégio, melhor faculdade, termos os melhores corpos, sermos simpáticos e limpos, antenados com todas as modas – temos de fazer isso tudo para não sermos excluídos. E, depois de ter filhos, ainda nos preocupamos se eles também vão ser excluídos.

E vamos falar a verdade: É uma barra, né não?

E vai ficando mais difícil com o tempo.

Dá até medo de questionar tudo isso, pois pode significar que fizemos alguma merda no caminho.

Mas a todo momento o modelo de exclusão está sendo perpetrado. A exclusão gera o outro, o cracudo, o deficiente, o velho desatualizado e inútil, o antissocial, o gay. Eu pergunto: Como alguém pode se sentir bem com uma sociedade que não o quer? Isolar alguém só aumenta o descrédito no outro e no sistema.

E mesmo assim vemos casos como a ação da polícia no Pinheirinho em São Paulo (ver mais sobre aqui). Uma comunidade de pessoas que foram expulsas de um outro lugar e que acabam de ser – adivinha! – expulsas novamente. Uma ótima solução, né? Com certeza vai funcionar. E, pra quem não percebeu, estou sendo irônico, estou até com uma sobrancelha franzida enquanto escrevo.

E assim vai, e assim continua, em cracolândias, no Pinheirinho, em famílias de classes pobres, médias e ricas, no trabalho e em tudo quanto é canto. Isolar é sempre a solução procurada, mas não integrar. Até quanto tempo vamos continuar assim?

Infelizmente podemos continuar até a raça humana se extinguir, mas pra que vivermos nessa situação de medo, se pudermos fazer algo. E podemos.

Não é fácil, é difícil pra caralho, mas vale ocupar a sua cabecinha. É a evolução da humanidade, entende? Será que é tão bobo pensar num mundo melhor? Você prefere aguentar a situação descrita nas linhas anteriores?

Nos dias a seguir, pretendo me voluntariar em orfanatos e outras instituições. Também pretendo me inscrever num projeto de Contador de Histórias. Por que não tentamos todos fazer isso e ver no que vai dar, quem sabe esbarramos com uma utopia no meio do caminho.

Deixo aqui o meu manifesto, pois todo pensamento é o ponto de partida de uma ação, de uma manifestação. É hora de tomarmos as rédeas de nossas escolhas. Ouço tanto falar o quão máximo é essa nova geração, a tal geração Y, a que gera rios de dinheiro com sua maravilhosa criatividade. Talvez essa geração possa gerar felicidade também, principalmente se colaborar mais com outras gerações, descobrir novas formas de se conviver.

Só a convivência diminui o preconceito, tudo é sobre aprendermos a conviver. É o que mostra que apesar de um detalhe ou outro não somos tão diferentes assim.

E lembre-se: dentro de você está Einstein e Hitler, está Jesus e o Diabo, Reis e camponeses, a poesia e o garrancho, loucura e sanidade, está o início e o fim, a capacidade de pensar e agir, que nenhum outro animal – nem ninguém mais nesse planeta ou nesse pequeno sistema solar – tem.

Faça bom uso. É o que peço a mim sempre e a todos que lerem esse texto.

Boa sorte.

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