Não sei se é o Pan, mas me deu vontade de falar dos meus tempos idos de infância, que, graças a Shiva, nunca mais irão voltar. Na verdade, o foco mesmo desse pobre texto é um dos momentos que eu mais odiava, na época, terror de quase todo jovem nerd, cdf e afins: a aula de educação física. Eu ainda estava, nesses dias, longe da minha puberdade - algo que aconteceu ontem - e ainda não havia me exposto aos raios gamas que me transformariam na coisinha linda que sou hoje; de forma que, o meu visual era composto por uma barriguinha proeminente, óculos gigantes e uma calça semelhante a um pára-quedas. Não preciso dizer que o colégio não era uma festa pra mim, mas realmente tudo ficava pior nas terças-feiras, quando tinha a fatídica aula.
Era horrível, uma verdadeira tortura nazista. Eu tinha que passar o dia inteiro com a roupa de ginástica por de baixo do uniforme normal, porque morria de vergonha de me trocar no vestuário, na frente dos outros garotos. Sem falar nos minutos que precediam à aula, quando a turma, ansiosa, transformava o pátio numa verdadeira guerra. Era um tal de empurra empurra prum lado, piadinhas para outro e eu cavando a minha trincheira em busca de proteção, o que nunca adiantava. “Ei, Társio”, chamavam, entrementes eu olhava para os meus dedos e fingia estar distraído. “Ô, mulequeee!!”. Concentrava-me inabalável no balanço dos meus dedinhos. Até que “Plaft” tacaram uma bolinha de papel na minha cara; agora não tinha jeito.
-Oi! Me chamaram? –disse, apertando os olhos pequenos para demonstrar o meu humor, o que me deixou praticamente cego.
-Cê é surdo ou é só feio mesmo?
-Eu...
-Então, responde essa pergunta. – falou o garoto enquanto os sidekicks dele seguravam suas risadinhas. – Você tá num navio com seu cachorro, chamado Noku, só que o navio começa a afundar. Então, o que você faz: leva Noku ou deixa Noku?
-Desculpa, não sei se entendi. – eu dizia com cara de tonto – eu to num avião e...
-Não. Está num navio. –corrigiu o menino, esfregando as mãos devido a expectativa de uma humilhação.
-Ah Navio! –bati com a cabeça na testa – É claro! Mas que tipo de navio.
-Isso importa? – irritou-se o menino
-Importa, porque dependendo da resistência do navio saberei quais são as minhas chances de sobrevivência. – respondi, limpando o óculos, o que geralmente causava mais efeito de presença, afinal as lentes ficavam mais embaçadas.
O menino desconfortável olhou para os sidekicks, que por sua vez se olharam e reluntantemente deram um sinal de aprovação. O dono da piada voltou-se então para mim novamente e inventou algo do tipo “Era um desses cruzeiros grandes que a gente vê no verão.”
-Muito melhor! –afirmei sorridente – Agora, a pergunta era se eu deixaria ou não a minha cafeteira, certo? Bem, eu levaria, claro. Não iria querer ficar perdido no mar sem um bom café.
-Que cafeteira o que, porra?! – finalmente explodia – Ah sabe de uma coisa, vamos te encher de porrada!
E eles nunca quebravam a promessa.
Mas, a algazarra terminava logo que aparecia o professor na sua cueca samba canção, que lhe dava o ar de “estava-folheando-a-minha-playboy-no-banheiro”. Ele mandava todo mundo para quadra, sentava no seu banquinho à sombra e começava a aula. A danada da aula consistia primeiro em alongamento – ou seja, espreguiçar-se –; segundo em exercícios físicos – ou seja, deitar no chão e tirar uma soneca; para os mais dedicados, imitar movimentos sexuais - ; e terceiro, futebol.
Por mais clichê que seja eu era sempre o último a ser escolhido. (por favor, não chorem) Só que essa era a parte divertida, porque todo mundo brigava para ver qual time não iria ficar comigo. Teve dois capitães que, só não se estapearam, devido a intervenção do professor. A parte chata era quando me mandavam para o gol, apesar das minhas afirmações sobre como eu jogava mal o bastante para sequer se considerado um perna de pau. É só agarrar a bola, diziam; pois bem, é exatamente esse o problema, preferia desviar delas, muito mais saudável. Dessa forma, as poucas bolas que agarrava, eram as boladas na cara, na barriga e em outros pontos do corpo. Quando percebiam a merda que fizeram, colocavam-me na linha, sem muito êxito também. Então, eu ia do gol pra linha, da linha para o gol, do gol para a saída mais próxima, antes que fosse vítima de uma horda furiosa de crianças.
No resto da semana, era só ouvir reclamações da minha atuação em campo que arruinou a chance de vitória do meu time, manchou o bom nome do futebol, trouxe seca e, segundo alguns experts, ajudou a piorar os conflitos do Oriente Médio.